Contos

Fazer a coisa

Assim que entrou em casa de volta do trabalho, encontrou seu marido pendurado pelo pescoço na viga do teto, bem no meio da sala. Analisou a cena por dois minutos, tentando entender o que acontecia. Viu quando ele, arrependido do gesto impensado e louco, apontou para a corda que o sustentava, querendo dizer algo sem conseguir, a garganta fechada pelo nó. Esperou mais três minutos antes de ir à cozinha, calçar um par de luvas e voltar com uma faca na mão. Seu marido esboçou um sorriso de alívio quando a viu subir num banquinho para alcançá-lo.

“Se quer fazer a coisa, faça direito ou então não seja burro e não se atreva”, resmungou ela, ao mesmo tempo em que executava, com o gume afiado da faca, um talho profundo nos dois pulsos do marido. O sangue começou a escorrer e a encharcar o tapete.

Voltou para a cozinha, guardou as luvas numa gaveta e lavou a faca ensanguentada sob o jorro de água quente da torneira. Enquanto aguardava que o marido finalmente ficasse exangue, começou a preparar o jantar. Estava com vontade de comer lasanha aquela noite.


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Mário Baggio

Mário Baggio é jornalista e escritor. Nasceu em Ribeirão Claro-PR. Mora em São Paulo-SP desde os anos 70. Tem 6 livros de contos publicados: “A (extra)ordinária vida real” (2016), “A mãe e o filho da mãe (2017), “Espantos para uso diário” (2019), “Verás que tudo é mentira” (2020), “Antes de cair o pano” (2022) e “A vida é uma palavra muito curta” (2024). Publicou contos em várias revistas eletrônicas (Germina, Gueto, Ruído Manifesto, Subversa, entre outras). Escreve quinzenalmente no blog literário Crônica do Dia e no Crônicas Cariocas. Participou da “Antologia Ruínas” (2020), “Tanto mar entre nós: diásporas” (2021), “Brevemente Infinito” (2024) e Antologia de Contos da UBE-União Brasileira de Escritores (2021 e 2023).

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