Do outro mundo
Vc conhece o outro mundo? Já foi lá? Sabe pelo menos onde fica?
Sou capaz de apostar: quase ninguém foi lá ou sequer pensa em sua existência. Afinal, para quê, vocês poderiam se perguntar.
Não sei responder.
Na verdade, nem é preciso. Mas hoje eu os vi chegando… às vezes aos pares, uns apressando os passos, outros olhando o chão onde pisavam. Rapazes e moças com andares leves, rápidos e sorrisos fáceis e também aqueles, cujos fardos invisíveis lhes amarravam as pernas, tornando o seu caminhar mais lento.
Senhoras sem vaidades, de cabelos contidos em toucas e jovens de cabelos (comprados ou não) esvoaçantes.
Vi quando adentraram ao mundo para onde vinham. Ficariam por algumas horas. Juntos, mas sem misturar.
No máximo, desculpem o trocadilho, terão entre si pequenos e diminutos pontos de contatos.
Mas de uma enorme importância, pois podem definir a vida presente e futura nos dois mundos.
Comunhões? Diálogos? Talvez
Familiaridade? Intimidade? Não! São ordens e avisos, às vezes sutis, outras explicitas, sempre com o intuito de “orientar” ou facilitar a vida dos habitantes de cada um dos mundos.
Karen acorda cedo, madrugada ainda. Tem muita coisa a fazer e a agilidade de quem não tem tempo a perder. Num instante ela está de saída, mochila nas costas, celular na mão, uma arrumadinha no cabelo e uma ultima olhada no que deixa para trás: o seu mundo.
Corre. Senta. Ainda bem. Se demorasse dois segundos, teria de se equilibrar.
Acomodada, suspira. Tem agora duas horas para viver em seu mundo. Duas horas em que ela paga, parcela, faz planos, reza, promete e sonha.
Desce. Daqui a pouco ela chegará ao outro mundo. Apressa o passo. Anda, sobe, acena, alisa a “farda”, sorri para o Luiz, cochicha com a Suellen; caminha mais rápido e finalmente chega ao seu destino. Uma última olhadinha ao celular, confere a hora, ajeita a trança e entra. Acabou. Ela não é mais dela.
Por algumas horas, os mundos se encontram… e depois se despedem, como se nunca tivessem se conhecido. Até amanhã, quando tudo recomeça.”