Sábado

  • Para quem é colo, amparo e parceria

    Domingo é o Dia das Mães. Por mais que saibamos a influência do comércio na criação e manutenção da data, seguimos envolvidos na programação do evento: o que dar de presente, o que escrever no cartão? Flores? Onde será o almoço? Qual vai ser o menu?

    Embora a mídia queira nos convencer de que tudo é lindo, sabemos que, para muitos, esse dia vem embrulhado de vazios, lembranças e saudades. Para outros, tristeza, mágoa ou rancor. De um jeito ou de outro, somos atravessados por esse calendário socioafetivo. Não é possível passar ileso ou distraído. Somos convocados a lidar com nossos afetos.

    Tem quem prefira esvaziar a importância do evento, argumentando: Dia das Mães é todo dia. Em parte, concordo. Mas não vejo problema em escolhermos uma data certinha para focarmos, mais atentamente, nos mimos de amor.

    Creio ser uma ótima opção para resgatarmos abraços que se perderam na correria dos dias, olhares que não se cruzaram tempo suficiente para trocarem sorrisos, frases esquecidas no “depois eu te falo”. A eleição de um momento específico de celebração não nos impede de desafiar a urgência da vida para demonstrar o amor que sentimos.

    Sempre é tempo de cantar o que vibra em nós.

    O Dia das Mães é domingo, mas hoje quando meu filho me surpreendeu com um pão com ovo e café feito por ele, para meu lanche da tarde, senti o conforto inestimável de ser amada nos detalhes do cotidiano. Mas adoro a ideia de que domingo tem mais!

    Que possamos todos nos apropriar desse dia para dedicar atenção e carinho àqueles que são colo, amparo e parceria em nossas vidas, independente do cargo ou função que ocupem.

    Celebre os seus!

  • As mulheres da nossa vida

    Eu tive avós. Na minha infância, eles eram a autoridade máxima da família. Austeros, respeitados e, por vezes, até temidos. Se filhos e noras já os tratavam assim, imagine nós: aquela penca de irmãos, primos, afilhados e agregados?

    A figura moderna dos avós é bem diferente. São os que mimam os netos, presenteiam em qualquer data, levam ao shopping, pagam terapeutas e se colocam quase como amiguinhos das crianças. Mas esses também já começam a se tornar raridade. Estão, como os antigos, em extinção.

    Ainda bem. Sou avó de dez netos. Sim, quase uma dúzia. Altos ou nem tanto, fofos ou nem tanto, achegados ou apenas educados. Cada um a seu modo. Fazem parte de mim, filhos dos meus filhos.

    Nesse pensar lento e silencioso, no tempo necessário para que as ideias se acomodem, compreendi o que tem me causado certa estranheza: são os ecos das realidades. As dos tempos atuais e as de que me recordo. E elas não pedem comparações, tampouco julgamentos. Apenas ecoam.

    Houve o tempo em que, embora  sem entender, obedecíamos. Porque o que diziam pais, mães, avós, nos dirigiam… Éramos crianças, mas sabíamos que aquelas palavras, o tom da voz, até o silêncio entre as frases, era amor. E um dia fariam sentido.

    O tempo se encarregaria disso. E tudo se tornaria claro em beleza, verdade e permanência daquilo que nos foi ensinado.

    O mesmo não  podemos afirmar sobre as novas gerações. Basta olharmos as redes sociais, onde a procura de aprovação a qualquer custo geram amor e ódios instantâneos.

    O mundo virtual substituiu as conversas e trocas de ideias. Um emoji “vale mais que mil palavras”. As certezas são instantâneas e as verdades absolutas.

    Personalidades construídas sobre alicerces frágeis não se sustentam, pois uma opinião contrária é capaz de provocar revoltas, rupturas ou até a perda do sentido da vida.

    Mas a memória leve de uma risada, de uma presença silenciosa, de um afeto firme e sem alarde sempre há de nos dar  a convicção de sermos pessoas fortes, capazes de enfrentar a vida e mudar de rumo quando necessário, sem nos perder.

    É o Dia das Mães…e escrevi sobre avós, famílias e valores… Sobre aprendizados e escolhas… sobre força e alicerces… sobre amor…

    Será mesmo que não falei das mães?

    Feliz Dia das Mães!

  • A Dama e o Vagabundo

    Minha porção mulher, que até então se resguardara, é a porção melhor que trago em mim agora, é a que me faz viver (Gilberto Gil, Super-Homem)

    A humanidade vem sendo regida há milhões de anos pelo macho da espécie. Chegou a hora de reconhecer: não deu certo! Como genuíno representante do sexo masculino, declaro peremptoriamente que entrego os pontos. Desisto! Nós, homens, já fizemos burradas suficientes. De minha parte, anuncio que passo o bastão às mulheres a quem humildemente me submeto, elegendo-as para cargos de comando e alçando-as a todas as atividades que envolvam exercício de poder. Pior do que está não vai ficar. Sei que não serei acompanhado por outros da minha estirpe pois conheço bem o tipinho que encarno: viril, orgulhoso, não dá o braço a torcer.

    Tenho um argumento infalível para convencer meus iguais. Já que você, ô marmanjo, não tem brio suficiente para admitir sua incompetência, pense nos seus filhos e netos. Se você os ama, dê-lhes ao menos a oportunidade de terem um futuro nesse mundo em frangalhos que sua gestão infeliz produziu.   

    Não imagino, por exemplo, que alguma mulher faria a insanidade de lançar bombas em cidades, assassinar adversários em massa, promover chacinas e genocídios, cultuar armas e perpetrar outras bárbaras atrocidades a seus semelhantes. As exceções que me recordo são as mulheres-bomba, que agiram a mando de… homens.

    Ou viramos a mesa ou o dito “homem” – por extensão, a raça humana, aí incluídas não apenas as mulheres mas as inúmeras categorias sexuais intermediárias emergentes – estará em poucas dezenas de anos extinto do planeta.

    O mundo como hoje conhecemos, vulnerável a vírus letais, ameaça nuclear, tragédia social, apocalipse ambiental, foi uma construção masculina, tem a face grotesca e brutal do inepto bicho-homem. Ou colocamo-lo sob nova administração, ou dito cujo já era.

    Trata-se de uma constatação lógica e me admira que a grande maioria dos indivíduos (especialmente aqueles que se orgulham mais do seu pênis do que do seu cérebro) não tenha ainda chegado a essa conclusão tão evidente.

    Não, não estou me rendendo às teses feministas. A pauta da sociedade igualitária não me fascina. Homem e mulher são seres biológica e psicologicamente distintos. O homem prima pela força física, pela razão, pela lógica. Já o chamado “sexo frágil” (que piada!) distingue-se pela formosura, pela sensibilidade, pela intuição, pela resiliência. Por ter o atributo da força, o gostosão impõe-se à delicada mulher que se submete a seu algoz que usa da bestial violência para ditar suas regras. 200 mil anos de civilização não foram suficientes para revogar a lei do tacape.

    O capitalismo adaptou-se perfeitamente ao patriarcado e definiu o papel de cada gênero no sistema. Ao homem, ‘chefe’ da prole, cabe negociar suas habilidades no mercado de trabalho e com a grana obtida, sustentar os gastos domésticos. A mulher fica em casa lavando louça, limpando a privada e cuidando das crianças, trabalhos ‘inferiores’ sem remuneração, não monetizados pelo mercado. Que sistema hipócrita! Gratifica apenas as atividades que interessam ao capital, exercidas pelo membro empoderado do casal. A fêmea desempenha a incumbência ‘acessória’ de amamentar o bebê e manter estruturado o lar, sendo dependente financeiramente do varão folgado que se embebeda e farreia nos botequins. Sejamos honestos: isso é uma deslavada exploração de mão-de-obra.

    A natureza concedeu à mulher uma função muito mais nobre e, para que ela a exerça com louvor, não precisa ocupar o espaço do homem. Se pleitear isso, estará admitindo que os valores masculinos são superiores. O que é preciso é que seja reconhecida a importância do seu papel, muito mais imprescindível que o do provedor financeiro.

    A mulher para brilhar não tem que ser cientista, filósofa, soldada, enxadrista, jogar futebol, lutar muay thay. Deixe os homens se sobressaírem nessas áreas. As damas têm habilidades muito mais indispensáveis na preservação do equilíbrio social do que as dos vagabundos, inclusive a principal de todas: gerar a vida.

    Por isso, caro amigo e cara amiga, está na hora de corrigir o rumo e mudar as regras do jogo. A começar por redefinir quem deve dar as cartas.

  • Essa superestranha

    Há poucos dias estava em busca de alguma série ou filme que tivesse como locação a Turquia. Viajo para lá em junho e queria me ambientar antes da partida. Adoro passar pelos lugares e ter o prazer infantil de apontar e dizer: olha ali! Lembra daquela cena? Nessa busca inglória, me deparei com uma novela turca cujo nome, por si só, já me fez dar uma risadinha debochada — A sonhadora. Pensei em desistir, mas acabei deixando de lado as minhas críticas ferinas. “Que coisa brega, deve ser igual à Sabrina, aquela revista tosca da minha adolescência”, “mais uma história de mocinha apaixonada” e apertei o play para o primeiro episódio. 

    Como imaginei, era tudo muito ruim, quase péssimo. Interpretações exageradas, furos de continuidade, diálogos e cenas sem consistência lógica, um sururu sem fim. Para não ser injusta, os protagonistas Can e Sanem embelezavam a tela sempre que apareciam; os cenários coloridos e as paisagens também eram lindos. Mas nada além disso. 

    O esperado era que eu desistisse de perder tempo com aquela besteira sem atrativos intelectuais que eu pudesse exibir para os amigos, mas não! Mesmo achando tudo muito esdrúxulo, questionando o mau gosto e a minha sanidade mental, acolhi inteiramente meu desejo e assumi: quero!

    Que me julguem. Essa também sou eu.

    Resumo da história: fiquei viciada nessa comédia romântica, perdi várias noites de sono para assistir os 160 capítulos da Sonhadora, me afeiçoei aos personagens, reencontrei lembranças minhas, senti brotar inspirações para um novo livro.

    Foram dias intensos. Aguardava ansiosa pela hora de estar no sofá e continuar a aventura de flanar pela trama, dar risadas, lágrimas, suspiros junto com eles.

    A história foi seguindo o caminho do fim. Eu fui seguindo o caminho de mim. Encontrando placas, avisos sobre a imprevisibilidade da existência e os milhões de fragmentos possíveis e inesperados que compõem esse vir a ser que me habita. De quebra, ainda pesquei algumas conclusões sobre quem efetivamente sou até então.

    O amor romântico é uma praga que me cativa inteira; a graça de viver flutua fora da caixa do padronizado; as coisas bobas da paixão me fazem rir com sincronia entre os lábios e a alma. 

    Foi maravilhoso rever essa estranha-familiar que aparece quando tudo some e só restam nós duas: eu e essa menina enamorada pelo poder da paixão na sua raiz mais clichê. Não julguem. O indicado, apropriado, o certo a se fazer numa escolha é circunstancial. Aceitem. Às vezes, o melhor que desejamos não é tão apreciável assim pelos outros. E daí?

    Nada é mais divertido do que ser o que se é, a despeito do que se pretendia ser para atender às demandas sociais.

    Obs: acabo de apertar o play para assistir o primeiro capítulo novamente. Estou viciada nessa alegria. Aceito sugestões de outras novelas e séries. Não precisa ser nada profundo, nobre, intelectualizado, culturalmente valorizado. Basta que seja leve, doce e despretensioso. Bom demais não precisar pensar, avaliar, entender, julgar, criticar, analisar. Só ser, sentir e viver.

  • Toda verdade é ato

    Ao tomar ciência da morte do Papa Francisco, um lamento silencioso me abraçou forte. Não frequento igrejas ou missas nem o conhecia pessoalmente, mas senti o pesar que a partida de um amigo distante e querido inaugura.

    A exploração excessiva da mídia, a monetarização advinda do uso selvagem da notícia do seu falecimento, a pequenez do mundo, tornou ainda mais evidente a grandeza rara desse homem que escreveu com atitudes o brado de uma ética de humanização do viver.  

    Seu maior legado talvez seja a mensagem cifrada em todas as suas ações: o amor genuíno, curandeiro de todo o mal, só floresce do respeito e da empatia entre os seres.

    Ele se foi, mas uma fração da sua eternidade ficou em mim.

    O bem reverbera!

    O Amor é colo que acolhe sem mimar.

    A verdade dos afetos e dos intentos vive nos gestos. O Papa Francisco escolheu ser sepultado na Basílica de Santa Maria de Maggiore em Roma, quebrando a tradição centenária de sepultamento na Basílica de São Pedro.

    Quantas coisas são ditas com esse ato…

  • Almas

    Almas rasas, almas profundas. Almas quietas, almas inquietas. Almas glutonas. Ou seriam corpos glutões? Almas machucadas, doídas, que não são percebidas. Almas irmãs, almas curiosas, almas altruístas.

    Olhar, esquadrinhar, perscrutar…

    É desonesto? É como espiar pelo buraco da fechadura? É pretensioso?

    Não sei… mas não consigo evitar. Meu olhar atravessa os corpos, vasculha os gestos, decifra os silêncios. Cada passo que vejo guarda uma história, cada olhar desviado esconde um receio. Há almas que se mostram sem perceber, e há outras que se escondem, mas não o suficiente.

    Ah, meus amigos…

    Como eu gostaria de ser uma alma bebê…

    Só assim eu deixaria de ver. De perceber. De saber.

    Uma alma inocente não veria malícias, subterfúgios, intenções. Não distinguiria as sombras dos sorrisos, as hesitações dos fingimentos. Viveria sem o peso da consciência, sem essa insuportável necessidade de compreender o que deveria passar despercebido.

    Quisera eu ter a inocência de estar desnuda e não perceber…

    Mas não! Prefiro estar oculta a estar desnuda…

    Afinal, para quê saber das fragilidades, da inocência, da malícia?

    Por quê? Para quê? Essa é a pergunta que atormenta a MINHA ALMA…

    E ainda assim, eu continuo olhando.

  • Ela morreu

    Sentada à mesa de um restaurante, aguardando uma amiga para o almoço de celebração da nossa amizade, chegou aos meus ouvidos uma frase, com efeito de fogos de artifício, dita por uma voz feminina, provavelmente da mesa ao lado:

    — Eu confiava nela. 

    No momento que decodifiquei o som e o sentido se fez claro, fui tomada por uma tristeza absoluta e uma identificação imediata com a enganada da vez. 

    Sem que nos conhecêssemos ou tivéssemos intimidade, experimentei, por osmose, a dor causada pelo corte profundo da decepção. O sangrar hemorrágico de um fim que se impõe mesmo diante do perdão. Toda falsidade ou traição fere a eternidade do sentimento, a ingenuidade da confiança. Sem isso, ela é outra coisa. Perde o viço, a raridade, o estado nato de berço. Mas tem quem não se importe, quem acredite que uma vez ferida, ela, a confiança, feito lagartixa, se regenera. Quanto engano! 

    Seu ferimento tem dor profunda, pulsante e incurável. Sua cicatriz é feita de queloide. Impossível retornar ao conforto inicial de sentir-se em casa diante do outro. Esse é o maior luto. A certeza de que não se volta ao estado natural de ingenuidade. Impressionante que as pessoas não se deem conta do que perdem com o fim da fé em si. 

    Eu confiava nela. Que triste! 

  • O que perdemos com o Wi-Fi

    A tecnologia nos trouxe muitas coisas. Mas o que ela levou embora? Creio que a pergunta poderia ser: as crianças ainda brincam? Acredito que brincam bem menos do que eu, meus irmãos e amigos! Os tempos mudaram.

    Ninguém mais fica na rua, na frente de casa. As famílias não têm tantos filhos. E com isso perdeu-se também o maravilhoso programa de irmos à casa da vó, onde os primos se encontravam e saíam esbaforidos para aproveitar o tempo e brincar.

    Passar anel, esconde-esconde, amarelinha, rolimã, pique, queimada, cabra-cega, “adivinha o que é?”, pular corda, cabo de guerra, telefone sem fio, cantiga de roda…

    Essas eram as brincadeiras antigas, normais e lícitas. Existiam também as perigosas: subir em árvores, descer de rolimã, guerra de sementes de mamona, roubar frutas nos quintais alheios, soltar espoletas…

    Quanta coisa existia em nosso mundo infantil! E os insetos? Será que as crianças conhecem os louva-a-deus, cigarras, esperanças, joaninhas, vaga-lumes?

    Os perigos eram conhecidos: não andar descalço para não entrar espinho no pé ou pisar em cacos de vidro; não subir no telhado para pegar a rabiola da pandorga; não sair sem avisar a mãe…

    A tecnologia mudou a vida dos adultos e a das crianças também.  Estimulou o aprendizado, os jogos lúdicos aumentaram a atenção e o foco, desenhos e filmes facilitaram o interesse por outros idiomas. Quem já não ouviu delas : Tem Wi-Fi?

    Em todos os tempos existirão brincadeiras inocentes e perigosas. Algumas desconhecidas… Na sala de casa, um celular e um frasco de desodorante podem ser fatais.

    Crianças são crianças.

  • Para Su e todas nós

    Essa semana uma amiga viveu uma situação bastante traumática e corriqueira no universo das mulheres: foi intimidada verbalmente por um colega de trabalho e ameaçada de agressão física durante seu expediente. Notem: um homem de quase 2 metros de altura levantou a mão na direção de uma mulher de 1,60 metros enquanto lhe ofendia aos gritos.

    Não vou citar o motivo do desentendimento porque me parece óbvio que nenhuma situação justificaria esse tipo de violência e covardia. Mas, se você se perguntou “o que ela fez para ele partir para cima dela?”, sugiro que você faça uma análise profunda sobre o nível de entranhamento da misoginia em seu comportamento.

    Fato é que ninguém interveio na cena nem a protegeu.

    O chefe da seção considerou justo ouvir todas as partes, como quem busca razão para perdoar o absurdo. Para agravar o desamparo, aproveitou para repreendê-la por ter usado uma palavra de baixo calão na discussão com o sujeito. Dando provas que os homens sempre se apoiam, defendem e blindam uns aos outros, validou a máxima: a mulher é sempre culpada.

    As colegas de trabalho preferiram não se meter, vai que apanham também… E minha amiga ficou ali, sozinha, vulnerável a todo tipo de manobra permitida por uma sociedade machista, misógina e escrota.

    Por que será que nós, mulheres, não nos unimos, apoiamos, protegemos umas às outras? Não formamos grupos, clãs, clubes que nos fortaleçam e amparem. Estamos constantemente julgando quem engordou, quantas celulites cada uma de nós tem, quem é mais brega ou rejeitada.

    Penso que a ideia do amor romântico, produto que só nós, mulheres, compramos, faz parte de um megaprojeto separatista. Afinal, competimos entre nós para sermos as mais bonitas, desejadas. Nos vestimos para suplantar as outras, nos medimos e criticamos em relação àquelas que julgamos sensacionais. Dificilmente oferecemos um abraço genuíno, uma guarida provisória, sem críticas, julgamentos ou comparações.

    Estou convencida de que essa luta inglória para ser “a tal” do pedaço, a poderosa do trabalho, a gostosona do reino nos enche de espinhos sem que nasçam pétalas. 

    Por sorte, minha amiga me ligou naquele dia horrível e juntas rogamos milhares de pragas naquele infeliz. Depois, rimos das nossas armas. Elas não são capazes de derrubar o inimigo, mas protegem a vítima da solidão imposta pela violência sofrida sem amparo e rede de apoio.

    Te amo, amiga! Esse infeliz há de ter um prejuízo financeiro grande, ou pior, vai ver seu time do coração perder a final do campeonato. De virada.

    O que mais seria capaz de afetar um homem?

    Voltamos a sorrir porque juntas somos mais. Juntas sabemos/podemos nos defender. Juntas somos nós!

  • Vamos tomar um café?

    — Um café? Sim, obrigada!
    — Toma um café comigo? Claro, vamos!
    — Aceita um cafezinho? Sim, aceito!

    Vejam só: em todas essas frases há um convite que vai além da xícara. Há cumplicidade, um gesto de carinho, quase um abraço em forma de aroma.

    Da história do café, lembro de uma narrativa antiga — um pastor de cabras africano, com a ajudinha de um monge, teria descoberto os efeitos revigorantes daquele grão escuro.

    Verdade? Talvez. Isso não importa. O que importa é o que ele representa: esse pequeno ritual que cabe numa xícara e aquece a alma.

    Tomar um café com alguém é mais do que saciar um gosto — é um tempo concedido, uma pausa generosa, um olhar que escuta. É o gesto de quem diz: “estou aqui com você”.

    O perfume do café pela manhã invadindo a casa é quase um sinal de que o mundo segue. É continuidade, é calor, é o anúncio de que mais um dia começou — e, com sorte, com afeto.

    Ainda que o café seja solitário, mesmo assim  ele faz companhia. É o cheiro que abraça. O gosto que desperta. O silêncio compartilhado com a gente mesma.

    O café da tarde tem seus rituais. Com a vizinha, com o parceiro, ou mesmo que você esteja só e com a cadeira vazia à sua frente, o valor de uma xícara é incontestável. Ele tem esse poder de reabastecer não só a energia do corpo, mas a ternura do coração.

    Ninguém convida um desafeto para um café. Isso diz muito. Café é símbolo de reconciliação, de recomeço, de partilha. Já esteve em cenas emblemáticas de filmes, já foi desculpa para uma boa conversa, já foi até poesia.

    Hoje, com o preço subindo mais do que o aroma na cozinha, na cafeteria ou no escritório, convidar alguém para um café virou quase um luxo afetivo. Mas vale cada centavo. Porque o café, mesmo caro, é a essência da cordialidade, do apreço e da simpatia. Por isso sempre vai ter o seu valor.

    Então, não se furte a um convite:
    Vamos tomar um café?

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