A paixão
é a antessala
de uma paranoia
na qual entramos
com um sorriso largo
de quem não sabe
que penetrou num túmulo.
A Sentinela em Fuga e Outras Ausências
Poema
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Poema #25: Becos e galerias que se bifurcam em T & L
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Poema #22: AZ-2
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Vozes inaudíveis
golpeiam meu silêncio
de bicho entocado.Sou perseguido por fantasmas
(desdobramentos de mim)
e os apascento
em precária unidade.Sei da existência sem vida
e dos hálitos fétidos da morte
que povoam a noite dos túmulos.Meu corpo é um mapa
onde se cruzam
os mais diversos caminhos
da imaginação fantástica.Tenho todos os demônios
empalhados no quarto
e cada dia escolho um
para sustentar os pesadelos.E sobre os meus despojos
carcomidos pelo tempo
e pelas mortes diárias
que impus a mim mesmo,
nascerá uma flor infernal
para devorar todos os homens.O Acaso das Manhãs
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Poema #20 – CONFIDENCIAL
Nada consta.
Consta que seja um nada
em face a uma constância
de extremos inarredáveis.
Enfim
um nada consta sobre
outro consta um nada
— A vida incerta do homem —
Nas folhas gastas do mundo
não consta nada em
detrimento desse nome.
Um simples nome em meio
a tantos outros no arquivo
de uma gaveta metálica.
O Acaso das Manhãs -
#13 – PROGRAMA NOTURNO
No silêncio sepulcral desta noite
abro a janela
e recebo a visita do demônio.
Juntos travamos um pequeno diálogo
acerca da destruição do mundo.Depois percorremos os cemitérios
e os ninhos dos pássaros agourentos,
respiramos o hálito da morte
e compactuamos da miséria dos homens.A noite era fria e indiferente
aos nossos propósitos de celebração.
Com dedos trêmulos cavamos o altar
de nosso macabro ritual.Antes, porém do sacrifício final
fomos resgatar a memória dos corpos
e garantir a permanência dos zumbis
sobre a face andrajosa do planeta.Abrimos um caixão e uma brisa vaporosa,
que era ao mesmo tempo fúnebre e sensual,
despertou nossos instintos de espécie
e pouco depois e para sempre estava
consumado o ato lascivo e sagrado.Chegamos depois ao altar fatídico,
e sob asquerosos protestos de ódio
à vida social e fútil dos vivos,
pegamos os punhais do sacrifício
e nos entregamos ao suplício eterno.O Acaso das Manhãs
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#10 – TECNO-POEMA
.
– Fala o poeta de vanguarda:
A estrutura do verso
está invertida
em meu caleidoscópio.
Preciso de uma máquina
rápida e perfeita para
fazer uma circuncisão mental:
“Quero que a estrofe
gravada ao jeito
do vídeo cassete
saia nítida,
sem um defeito”.– Fala a crítica especializada:
A infraestrutura do verso
está evoluída
em meu laboratório.
Preciso de um computador
rarefeito e sem defeito
para efeito de análise poética:
“O crítico é um digitador,
digita tão completamente
que chega a digitar a dor,
a dor que sua mãe sente”.– Fala o homem pensante:
A superestrutura dos acima
está equivocada
em minha concepção histórica.
Preciso de uma filosofia
autêntica e própria agora
para escrever um poema-amostra:
“A sombra projetada de um homem
exclui o mecanismo da repetição alheia,
pois a condição intrínseca dele mesmo
exige que seu poema se faça de ideias
e despreze a vida enquanto justificativa
para o erro de se caminhar junto ao tempo”.– Fala um observador imparcial:
Poesia significa
abrir caminho para o abismo
e pedir que nos devolvam
o nosso sonho antiatômico.O Acaso das Manhãs