O azul e a lágrima
A manhã estava calma. Calma como um gato se espreguiçando.
Tinha combinado de almoçar com um amigo, ali pros lados do Mercado Central. Um passeio tipicamente mineiro: caminhar pelo centro sem pressa, sem carros, sem aquela multidão apressada. Nem buzinas, nem o relógio invisível cobrando compromissos. Conversávamos sobre música, livros e algumas bobagens que fazem bem. Uma moça gritou:
— Gente, olha ali! O que é aquilo, meu Deus?
Na esquina da Augusto de Lima com a São Paulo, dois moleques batiam num velho. Tentavam arrancar algo dele. O homem reagia como podia. Dava uns sopapos, levava outros.
A cena corria diante dos olhos da cidade. O povo assistia. Comentava. Protestava — só com a boca. Braços e pernas, não. Esses estavam mudos. Uma moça gritou:
— Eu filmei tudo! A polícia vai pegar! Tá tudo aqui!
Até que um homem, forte e corajoso, entrou no meio. Encarou os pivetes. Eles correram. Sumiram como ratos quando a luz acende.
A tristeza embaçou minhas vistas. A manhã perdeu o brilho. O sol, as árvores, os pássaros — tudo parecia cenário falso.
Que cidade é essa que assiste calada um velho apanhar? A paisagem virou ruína.
O homem forte correu atrás dos garotos. Não sei no que deu.
Fui almoçar com meu amigo. Porque, mesmo triste, a gente almoça. Conversa. Toca a vida.
Ficou só uma prece, em forma de crônica:
Alguém, por favor, olhe para esta cidade.