Literatura

  • Ela morreu

    Sentada à mesa de um restaurante, aguardando uma amiga para o almoço de celebração da nossa amizade, chegou aos meus ouvidos uma frase, com efeito de fogos de artifício, dita por uma voz feminina, provavelmente da mesa ao lado:

    — Eu confiava nela. 

    No momento que decodifiquei o som e o sentido se fez claro, fui tomada por uma tristeza absoluta e uma identificação imediata com a enganada da vez. 

    Sem que nos conhecêssemos ou tivéssemos intimidade, experimentei, por osmose, a dor causada pelo corte profundo da decepção. O sangrar hemorrágico de um fim que se impõe mesmo diante do perdão. Toda falsidade ou traição fere a eternidade do sentimento, a ingenuidade da confiança. Sem isso, ela é outra coisa. Perde o viço, a raridade, o estado nato de berço. Mas tem quem não se importe, quem acredite que uma vez ferida, ela, a confiança, feito lagartixa, se regenera. Quanto engano! 

    Seu ferimento tem dor profunda, pulsante e incurável. Sua cicatriz é feita de queloide. Impossível retornar ao conforto inicial de sentir-se em casa diante do outro. Esse é o maior luto. A certeza de que não se volta ao estado natural de ingenuidade. Impressionante que as pessoas não se deem conta do que perdem com o fim da fé em si. 

    Eu confiava nela. Que triste! 

  • Um escorrego de morfologia

    A frase abaixo foi retirada de uma matéria da IstoÉ sobre um medicamento contra a impotência:    

    “Por ser ingerido diariamente, não é preciso calcular quando ter relação (os outros remédios exigem um tempo para fazer efeito).”

    Li críticas de professores de português à flexão do verbo “ter” nessa passagem. Dizem que a forma correta é “tiver”, pois ele estaria empregado no futuro do subjuntivo. Um dos que defendem esse ponto de vista escreve: “Este (o futuro do subjuntivo) participa de orações iniciadas pela conjunção ‘se’ (condição hipotética futura) ou pela conjunção ‘quando’ (tempo hipotético futuro).”

    A explicação seria correta se o vocábulo “quando” naquele contexto fosse mesmo conjunção. Ou seja: se a oração iniciada por ele se classificasse como adverbial temporal. Não é isso que ocorre.

    Vejamos por quê. O autor da matéria se refere a um medicamento que, ao contrário de outros com o mesmo fim, pode ser usado todos os dias. Essa frequência traz uma vantagem ao usuário: não precisar calcular o momento adequado para ter relação. Tal vantagem não existe em drogas similares, que “exigem um tempo para fazer efeito” e, consequentemente, determinam que os usuários escolham a melhor ocasião de tomá-las.  

    Assim, a palavra “quando” naquela frase não é conjunção, mas advérbio. Introduz oração objetiva direta, na qual exerce função sintática. Considerar a oração indicada pelo “quando” como temporal deixaria sem complemento o verbo “calcular” e sem sentido a frase (calcular o quê?). De fato, o autor não quis dizer que se precisa calcular “alguma coisa” no momento de ter relação; esse momento (ou seja, o “quando”) é o próprio objeto do cálculo.

    Nesse tipo de construção a oração objetiva se diz justaposta, pois é introduzida por um termo que, ao contrário da conjunção, exerce função sintática. Além de “quando”, podem aparecer outros advérbios ou locução correspondente. Por exemplo:

    — “não é preciso calcular como ter relação” (modo)

    — “não é preciso calcular onde ter relação” (lugar)

    — “não é preciso calcular quanto ter relação” (intensidade)

    — “não é preciso calcular por que ter relação” (causa)

    O infinitivo, nesse caso, constitui o verbo principal de uma locução com auxiliar modal implícito (poder ou dever): “não é preciso calcular quando (se pode ou deve) ter relação”.

    Enganos como o acima referido mostram o perigo de classificar vocábulos ou orações sem atentar para o sentido da frase. Resultam de um hábito por vezes comum no aprendizado da língua, que é o de decorar classes de palavras. Quem faz isto parece esquecer que elas se definem de acordo com o contexto.

  • INTERTEXTUALIDADES

    .

    Um escritor nunca escreve sozinho…
    Antes, escreve com todas as vozes
    Que sussurram a todo instante
    histórias e versos
    Acertos e desacertos
    Melodias e ilhas
    Desconcertos…

    Sou Cecília…
    Oswald, Mário, Carlos… Andrades!
    Sou também Bandeira!

    Camões, Pessoa, Castro e muito mais.

    Sou Clarice…
    Veríssimo, Graciliano, Rosa,
    Sou também o cais.

    Jorge e Murilo e  muito mais.

    Sou o que sou: olha só os tais!
    Pouco, muito…
    E até coisas banais.

    E desfaço o ser quando entender…
    e é o que basta,
    mas

    não sou sozinho, sou inteiro,
    sou vários, por vezes inabitável,
    propenso e líquido

    e, ao mesmo tempo,
    uma cidade inteira
    contrassenso

    Sou Mia, Leminski, Milton
    Caetano!
    E não há engano!

    Sou Machado
    E o texto, ironicamente,
    É mais afiado.

    Sou Carlitos, o vagabundo,
    Sou parte itinerante

    Das lembranças do mundo!
    Sou e não sou a cada hora.
    E o relógio não tarda.

    Agora
    Sou todos os textos e canções
    Sou todas as rimas e emoções

    Um escritor nunca escreve sozinho…
    Antes, escreve com todas as vozes
    Que sussurram a todo instante
    histórias e versos
    Acertos e desacertos
    Melodias e ilhas
    Desconcertos…

  • Rebentada

    Caminha ereta, embora isso custe e doa. Os dois meninos, de cabeças enormes e pernas finas, acompanham como podem o ritmo da mãe. Parecem frangos doentes, ciscando inutilmente num terreno seco. Andam os três sobre uma terra rachada e poeirenta. O horizonte continua distante, tão distante quanto no dia em que iniciaram a jornada a pé. O sol permanece no alto, maltratando os olhos, a pele e a esperança.

    O menor dos meninos, vencido pelo cansaço, senta-se numa pedra e curva a espinha para a frente, até que seu peito quase toque o chão. Visto de longe, parece uma fruta que apodrece aos poucos, mas de perto é só um menino cansado, sujo e com fome. A mãe o ajuda a se levantar e o carrega nos braços, como se levasse um punhadinho de folhas secas caídas de uma árvore, embora naquelas bandas não haja árvore, só deserto.

    Levam já quatro dias andando e ainda faltam mais quatro para chegarem ao campo de refugiados. O outro menino, mais velho e mais esperto, sabe que não vai aguentar. Resolve interromper a caminhada e põe-se de cócoras, as mãos sobre a cabeça. Neste caso não há diferença se visto de perto ou de longe: é um menino que desistiu.

    A mãe põe o pequeno no chão e pensa. Avalia que será impossível avançar com os dois no colo, não terá forças. Levanta os olhos para o céu e chora sem lágrimas, rebentada por dentro. Sabe que vai morrer sob o punhal afiado da escolha, mas não hesita. Olha para um, depois para o outro e recomeça a caminhar, puxando só um deles pela mão.

  • Poema #18 – NA PENUMBRA

    .

    Na penumbra
    me faço grande
    como minha sombra na parede.

    Porém a parede
    não é intacta
    como a cerâmica do banheiro.

    Suas imperfeições
    remetem-me para além dela mesma
    e me vejo em cada detalhe
    mal sucedido de sua arquitetura.

    Na penumbra
    me faço gente
    como as presenças que me povoam.

    Porém o sonho
    não corresponde
    à realidade imaginada.

    Os monólogos com a sombra
    remetem-me para além de mim
    e me sinto em cada possibilidade
    de acender a lâmpada
    e não perder o mágico domínio.

    O Acaso das Manhãs

  • Por isso escrevo – parte II

    Estou revisitando meus contos, crônicas e estudos sobre escrita criativa. De vez em quando, tenho rompantes de “chefe”. Deve ser coisa do hábito — afinal, diz o ditado popular “o uso do cachimbo entorta a boca.” 

    Durante anos, fui supervisora na repartição onde trabalhei e, vez por outra, precisava revisar processos. O quê, como, quando, por quê, para quê.

    Agora estou aqui, na curiosa posição de algoz e vítima da minha antiga função.

    Revejo os cursos que fiz, as anotações, os exemplos, as descobertas. Tudo o que estudei, registrei e arquivei ao longo dos anos dedicados à escrita. Algumas descobertas me orgulham; outras, frustram — como em tudo na vida.

    De tudo tenho a certeza que é preciso coragem para deixar fluir minhas ideias e sentimentos, o caos da minha mente, ver o texto tomar forma e soltá-lo no mundo, para que encontre eco e sentido em meus leitores.

    Ainda assim, o saldo é positivo. Fiz muitos cursos, tive diversos mentores, explorei diferentes camadas da arte de escrever.

    Busco encontrar a essência da escrita criativa e nela me desenvolver.

    Sei onde posso pisar com segurança e onde prefiro não arriscar — como escrever romances, seguir roteiros rígidos, usar escaletas.

    Não, essa forma de escrita, não me atrai.

    Quero escrever. Gosto de contar histórias. Criar crônicas que dialoguem com o leitor, provoquem reflexões ou simplesmente narrem o cotidiano.

    Ainda não li o livro de Marcelo Rubens Paiva que inspirou o premiado Ainda Estou Aqui, mas imagino que seja uma história contada com alma. Uma literatura carregada de emoção, escrita por alguém que viveu aquele tempo e cenário, que sentiu na pele medos e dores. Diante disso, a última coisa que importaria seria a aplicação de teorias sobre escrita.

    É isso que quero dizer: quando um autor permite que sua alma fale, a técnica se torna secundária. O valor está na emoção, na verdade que extrapola a forma do texto.

    Isso significa que o estudo não importa? Claro que não! Mas, lá no fundo, gosto de acreditar que a história precede a escrita.

    E, pelo sim, pelo não, sigo estudando. Porque escrever faz parte de mim — de quem eu sou.

  • A coleira do cão e a coleira do homem

    Um homem de “maus bofes” passeia pela rua com seu cachorro de estimação que, apesar do jeito ranzinza do seu dono, vai caminhando ao lado dele alegre, saltitante, interessado, bem mais que o seu dono, nas alegrias do mundo.

    A alegria do cachorrinho é fascinante, parece totalmente livre e independente do péssimo humor do seu dono; homem que, ao contrário do cachorrinho, é quem parece estar numa coleira. Invisível, sim, mas uma coleira de qualquer forma.

    Bom, pessoalmente, gosto de um trecho das Escrituras Sagradas que diz que “Basta a cada dia o seu próprio mal”; o problema é que, preso por uma coleira invisível amarrada ao pescoço, o homem vai imerso nos seus pensamentos, apegado ao seu humor, sua má sorte; ao contrário do cachorrinho de estimação dele, que celebra dos primeiros raios de sol, cumprimenta os desconhecidos na rua com olhos sorridentes, pula, agita-se, late e, para desgosto do dono, puxa a coleira, arranca o dono de seus pensamentos automáticos, seu jeito robótico e aí o homem puxa violentamente a coleira do cachorro, puxa com raiva.

    Ora, a mesma cena vi em outros dias, outras praças quando, cúmplices da alegria do bicho de estimação, outros donos soltavam a coleira e deixavam o cachorro correr livre, olhavam de longe, deixavam o bichinho gastar energia, experimentar a alegria, o sol da manhã. Depois, chamavam o cachorro pelo nome, pegavam a coleira de volta, seguiam o rumo numa amizade tão bonita de se ver.

    Porém (ah, porém), este não é o caso do homem que vai agora na rua. O cachorro e seu dono, visivelmente incompatíveis, seguem o rumo deles até que, já distantes de mim e do amigo que voltava  comigo de um bloco de carnaval, somem das nossas vistas para sempre.

  • Por isso, escrevo

    Aprender sobre literatura faz parte do meu dia a dia.

    Aposentei-me após trinta e cinco anos como servidora pública. Trabalhei mais cinco anos nessa condição, até decidir que era hora de dar espaço ao novo. Mas que novo? Os jovens que me substituiriam no trabalho? A nova rotina, sem horários rígidos ou prazos? Ou, mais que tudo, o novo que sempre esteve em meu subconsciente?

    A vontade de escrever, de me dedicar à literatura, de compreender meus autores favoritos e sentir o gosto de transformar em palavras o que habita minha imaginação. Resolvi estudar. Aprendi muito, mas sei que ainda há um longo caminho a percorrer.

    Descobri a escrita criativa, o lirismo, o poder dos adjetivos bem escolhidos, a força das figuras de linguagem usadas no momento certo. Percebi que os acontecimentos não devem ser apenas narrados, mas transformados em literatura, com musicalidade, ritmo, beleza — e não simplesmente relatados como em um noticiário.

    Aprendi a selecionar adjetivos, a escolher substantivos, a encontrar poesia nas palavras.

    As narrativas devem fazer sorrir, refletir, provocar, revelar o mundo além do que se vê e se ouve. A riqueza da língua portuguesa deve encantar tanto a mim quanto ao meu leitor.

    A vida dança entre amores, desamores, honra, destino, vingança, ordem ou caos — inquietação e paz.
    Desses dilemas busco a matéria-prima da minha escrita, onde escolho as cores e sabores que coloco nas histórias que povoam a minha mente.

    Por isso, escrevo.

  • Considerações de véspera sobre a véspera

    Véspera. Do latim vesperae. A tarde, ao cerrar da noite. Poeticamente, ao encerrar um ciclo solar. Dos pequenos, claro.

    Deriva também de Vésper, a estrela que não é estrela, visível a olho nu quando a tarde cai.

    Véspera é o território preferencial da ansiedade. Quando estamos a poucos passos ou horas daquilo que desejamos. Ou não desejamos mas é inevitável que venha até nós.

    Dizem por aí que a arte reside em controlar a ansiedade da véspera. Papo. Eu já tentei inúmeras vezes em mais de cinquenta anos de existência. Nesse tempo todo jamais – ou quase jamais – tive sucesso. Perco o sono que é uma beleza.

    Achei seis dicas para domar a ansiedade, reunidas pela BBC, British Broadcasting Corporation, fundada em 1922. As dicas da centenária BBC são:

    Monitore os seus pensamentos.

    Faça atividades físicas e pratique meditação.

    Encontre um propósito – nem que seja cuidar de seu animal de estimação.

    Veja o lado bom da vida (por mais que isso seja desafiador)

    Viva no presente.

    Busque terapia – na sexta posição e, a meu ver, como último recurso se os demais falharem. Ainda não cheguei aqui mas é bom ter a lista à mão. Se bem que umas linhas acima eu admito que perco o sono por ansiedade. É, acho que já é o caso de terapia. Mas vejo isso depois de malhar na academia.

    Voltando.

    Há sucessos que só duram até a véspera, como o reinado daquele rei destronado em batalha no dia seguinte. Ricardo III que teve insônia – olha mais um!!! – na noite anterior ao combate e foi assombrado por fantasmas daqueles que morreram por sua culpa. Ao menos é o que está na peça de Shakespeare que já se sabe é historicamente imprecisa. Um detalhe que não ofusca sua beleza dramática.

    Seguindo.

    Véspera da decisão daquele jogo em que o craque de um time foi para a farra e o outro foi atender ao chamado de um menino que acordou na emergência infantil do hospital chamando pelo seu ídolo. Foi na zona sul do Rio de Janeiro, no século passado, o craque prometeu ao garoto o título. E no dia seguinte, com gol de barriga cumpriu a promessa.

    No século XVII o pintor, arquiteto e artesão espanhol Alonso Cano fez uma obra em madeira intitulada “Véspera” que está na catedral de Granada, Espanha.

    O bem humorado Adoniran Barbosa tem um samba chamado “Véspera de Natal”. Termina em comédia pastelão com direito a ação do corpo de bombeiros

    “Véspera” é o nome do terceiro livro da escritora mineira Carla Madeira. Não li mas espiei uma resenha e acho que deve ser uma obra bem interessante. Vou em busca.

    Todo esse papo aleatório porque hoje, sexta-feira, 23 de setembro, é véspera. Mais uma de muitas, dirão.

    Mas para mim, a mais importante das vésperas. Quando o sábado chegar será festa. Contemplarei o momento e o viverei na boa companhia das estrelas da minha vida. Andaremos pelo mundo, plenos de alegria e em busca de diversão tendo aos ouvidos “Ode à alegria”, de Beethoven. Ao cair da noite, estaremos juntos, cansados e felizes.

    Agora, na véspera, tentarei inutilmente ao longo do dia domar a ansiedade. E a noite, só me restará achar o sono.

  • Vida e tempo

    Outrora as pessoas morriam mais cedo e nem assim deixavam de fazer as obras que poderiam notabilizá-las. Parece que a consciência da brevidade da vida levava-as a intensificar seu trabalho. Era como se, intuitivamente, soubessem que não tinham tempo a perder. Ameaçadas por um número maior de doenças sem cura, não podiam se dar ao luxo de adiar projetos e sonhos. Nossos poetas românticos, por exemplo, deixavam este mundo na flor da idade, ceifados pela sífilis ou pela tuberculose, mas as suas obras pareciam consumadas. Eram o melhor que eles poderiam fazer.  

    Hoje é diferente. Graças aos avanços da medicina e da farmacologia, nossa média de vida aumentou. Não podemos nos queixar de falta de tempo. Quem antes tinha quarenta ou cinquenta anos se considerava um velho. Hoje o indivíduo com sessenta sente-se disposto a recomeçar a vida. Supõe que ainda terá muito caminho pela frente.

    Antigamente o desafio era viver mais. Hoje, é viver melhor. Fala-se muito em qualidade e não em quantidade de vida. Uma vida longa, mas deficiente, não parece valer a pena. Isso nos remete à velha questão: o ideal é viver pouco, mas com intensidade, ou viver muito porém de forma rotineira e insípida?

    Muitos alegam que viver da primeira forma é melhor, mas o que desejam mesmo é permanecer vivos (mesmo que isso implique enfrentar os contratempos da velhice). Há um consenso segundo o qual quem vive muito triunfa sobre os que morrem mais cedo. A longevidade aparece como um troféu que confere ao indivíduo admiração e prestígio, e só os incompetentes e desleixados se deixam colher precocemente pela morte.

    Para ganhar esse troféu é preciso se submeter a um tipo de corrida diferente, no qual ganha quem chega por último. Diante disso, é melhor não se apressar. Certamente a melhor fórmula para obter esse prêmio é viver com moderação, evitando o estresse e outros males que nos impulsionam a uma existência trepidante. São grandes os malefícios que essa trepidação traz ao nosso organismo.  

    Viver devagar, no entanto, é um enorme desafio num mundo em que se exalta a excelência e o acúmulo de realizações. Como botar um freio na rotina se somos permanentemente convocados à competição e, em vista disso, a nossa agenda está sempre cheia? Quem tenta frear o ritmo não raro se sente excluído. Ao buscar se desprender das amarras que o vinculam à engrenagem do dia a dia, é tomado pelo tédio e a insatisfação. Conheço gente que, embora se queixe do excesso de trabalho, não suporta os domingos e feriados. Acha que neles falta alguma coisa.   

    O fato é que, mesmo com as cobranças do mundo moderno, hoje vivemos mais. Isso não significa que vivamos melhor nem que o maior tempo de que dispomos nos leve a realizações significativas. Todos temos momentos em que as coisas de fato acontecem, e outros em que nos limitamos a “tocar” biologicamente a vida. Ninguém garante que, se vivesse mais de 24 anos, Castro Alves teria feito poemas superiores aos que fez. Viver mais também não deixa de ser um problema; implica um desafio maior para a conquista e a manutenção da felicidade.

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