Crônicas Cariocas

  • Dia Internacional das Mulheres

    Caras amigas, manas, iguais…

    Temos um dia.

    Sim, um dia dedicado a nós. Num mundo dominado pelos homens, isso não é pouco!

    Pouco é o quão precária ainda é nossa rede de apoio. Pouco são os que nos valorizam para ocupar lugares de liderança, chefia, comando. Pouco são os que reconhecem que homens e mulheres merecem o mesmo espaço de fala, de presença, de decisão na vida.

    No entanto, eu me aproprio da homenagem e da data: 8 de março.

    Não faço fila com quem acha que nada temos a festejar. Celebro com as mulheres da minha família, da minha vida acadêmica, do meu trabalho e com todas aquelas com quem divido esta grandiosidade que é a vida.

    Acredito que aprendemos a viver, sobreviver e sobressair neste mundo ainda tão machista.

    Nós, mulheres, temos a sabedoria de aquietar a mente, cultivar o silêncio, exercer o amor próprio.

    Uma pequena pausa — minutos, dias, anos, não importa… Logo renascemos,

    prontas para acreditar, nos reinventar, empreender.

    E para comemorar nosso dia, nada como esta frase de Clarice Lispector:

    “Sim, minha força está na solidão. Não tenho medo nem de chuvas tempestivas nem das grandes ventanias soltas, pois eu também sou o escuro da noite.”

  • Quanto custa vencer?

    Quem desfila em escola de samba ou torce por uma, sabe a tensão que é aguardar o momento da apuração na Quarta-Feira de Cinzas. 

    Quem não é folião, mas já aguardou um resultado importante, seja de concurso, campeonato, teste de gravidez ou habilitação para dirigir, entende bem a agonia que me refiro:  uma espécie de cócegas misturada a uma comichão intensa, seguido de um aperto no estômago, a repercutir numa certa bambeira nas pernas e um escorrer de suor no trajeto das costas. O pensamento também se envolve nesse parangolé: a cada 15 minutos, furando a fila de outros pensamentos, surge: será que  venceremos? Será que o meu melhor foi suficiente? 

    Talvez o remédio para essa agonia seja pensar no trabalho realizado, na entrega ao longo dos meses, no vivido durante o percurso. Mas, no final das contas, o resultado é sempre soberano, ainda que nem sempre seja justo ou corresponda a realidade.

    Somos reféns da validação dos números, do reconhecimento do outro, da aprovação dos grupos. Vítimas de uma necessidade visceral de ser, a todo instante, muito mais do que somos. E por quê? 

    A maldição é tamanha!

    Quem nunca sentiu o desconforto de viver no perímetro do próprio corpo, feito quem passa o dia num sapato que aperta o calo ou arranca a pele do calcanhar? 

    Essa é a única crítica que faço ao Criador: deveríamos nascer com um dom nato para nos amarmos profundamente; e ainda mais intensamente quando diante de demandas e expectativas contrárias à expressão genuína de quem somos na íntegra. Assim, mais do que viver em estado de tensão/avaliação, aguardando o boletim social, a aprovação final, viveríamos na tranquilidade de um lar interior sereno, com uma compaixão sincera pelos infelizes que não fossem capazes de nos aceitar in natura. Mas a competição, a inveja e a mania de perfeição parecem ser o que há de mais resistente e duradouro no DNA da humanidade. Que pena!

    Volta o desassossego: será que a Imperatriz vai vencer?  Seremos campeões?

    Ah, como desejo sentir essa alegria…

    Se não acontecer, que diferença faz?  Não foi tempo perdido, foi tempo vivido, suado amado, crescido. Continuará sendo minha rainha, e no próximo carnaval, novamente, estarei lá.

    Já é hora de entender que frustrar-se faz parte do que chamamos existência. É decepção, mas, não é destruição ou desilusão. É possibilidade de recomeço, reinvenção, retomada.

    Feito purpurina, brincando no ar ou caída no chão, é brilho que não deixa de brilhar.

    Ah, como quero sentir a grandeza de ser feliz por ter vivido mais do que por ter vencido.

    Sei que você, leitor, quando encontrar esse texto, que será publicado no sábado, o resultado já será conhecido, o futuro de agora será passado, mas eu precisava dividir minha angústia e minha promessa com alguém de minha confiança.

  • DIGNÍSSIMO CANALHA

    Pelo presente instrumento, venho dirigir-me a vossa excelência. Com minúsculas e na segunda pessoa, pessoa de segunda que és, mauricinho de nariz empertigado. Tu, que te ocultas, sorrateiro, por trás dessa impecável e pretíssima toga escrota. Tu que recebes aprumado a reverência do povo de joelhos à espera de tuas soberanas e irretocáveis decisões peremptórias. Tu que estás imbuído da divina prerrogativa, intransferível e vitalícia, de deliberar sobre o destino dos homens que habitam o mun­do dos vivos, já que o dos mortos foge à tua jurisprudência, instância suprema à do teu Supre­mo. Tu que reclamas indignamente indignado por direitos inalienáveis e vives na intimidade inescrutável da tua vida pri­vada de práticas inconfessáveis. Tu mesmo, nobre calhorda, que de tanto exercer o ofício de julgar os outros, julgas-te acima dos outros.

    Venho oficiar-te, honorável patife, que há mais retidão e honra na palavra espontânea e honesta que brota do coração de um humilde iletrado do que no alfarrábio que sustém tuas áridas, infindáveis, mirabolantes e ordinárias sentenças. As mesmas que apões em papel pergaminho com letras douradas, fazendo-as constar dos anais onde exibes tua soberba grandiloquência farisaica e tua rocambo­lesca sapiência estéril.

    Amealhas com vileza recursos subtraídos do povo injustiçado para manter intacto esse intrincado e indecifrável sistema, tão inócuo quanto iníquo, que qualificas cinicamente de Justiça, a fim de cobrir com aura de magnificência e infalibilidade essa espeta­culosa e suntuosa pantomima patética e embusteira que estarrece as legiões dos sem-justiça desse país, mantendo­-os sob o jugo do teu julgar.

    Cultivaste esse interminável cipoal de leis, decretos, normas, códigos, tratados, regimentos, resoluções, regula­mentações, pareceres, dispositivos e medidas provisórias para reservares a ti próprio o monopólio do conhecimento e das práticas a ti outorgadas tautologicamente “por lei”, afastando o povaréu inculto de teu demarcado territó­rio. Para que, na mesma medida em que amplias a doutrina do direito, reduzas o primado da justiça.

    A chave de tua inoperância chama-se prazo. Conside­raste, eminente pulha, que, após décadas de espera, a sentença já foi proferida, independente do transitado em julgado? Abstrais, emérito canalha, a variável tempo sob pre­sunção de que o tempo é uma mera ‘questão de tempo’. Adias, protelas, procrastinas, prorrogas, retardas, demoras, protrais, diferes, pospões, alongas, espichas, espacejas, alastras, esticas, dilatas, intervalas, encompridas, acresces, amplias, expandes, empurras com a barriga. Pois, então, devo informar-te, distinto safardana, que quem aguarda por anos, seja nutrindo a raiva da privação de benesses não fruídas, seja gozando do deleite de penas não cumpridas, já é repositório da sentença, seja esta qual for. Em meio a tantos réus, jurados e testemunhas, apenas um deve ser declarado culpado em todas as instâncias: tu, criatura ignóbil.

    Sai da tocaia, egrégio velhaco. Desce desse palácio de letras, capítulos, parágrafos, alíneas, incisos, caputs e cláusulas em que te enclausuras. Cumpre salientar, excelentíssimo pústula, que as cruas ruas, inobserváveis das janelas do palácio que ergueste, sem decurso de prazo, para te isolares da re­alidade de fato e de direito, estão repletas de malfeitores que levianamente livrastes das masmorras. Não por um senti­mento benevolente de perdão ou por uma crença abnegada no poder de recuperação humana, mas por uma ardilosa interpretação das normas vigentes. Delinquentes de toda a es­pécie a quem remistes da pena, hoje libertos de punição, zombam, sob tua retumbante indiferença, dos tolos que se pautam em princípios e honradez.

    Vivem os justos à margem das formalidades legais que queres agrilhoar os cidadãos, a fim de emparelhares todos pelo mesmo nível de calhordice de que imaginas serem, por na­tureza, dotados. Por certo, espelhando tua maneira de te com­portar e de enxergares os homens para necessitarem de tua mediadora e interesseira presença,

    Sob o manto do teu venerável ‘estado de direito’, corruptos, patifes, ladrões de todas as espécies ascendem aos postos de direção com a tua máxima leniência, amparando-os com a força irrefutável das brechas da lei, aplicando-lhes impiedosamente draconiana indulgência e intolerância zero. Cobrindo a impunidade com o manto legalista da imu­nidade.

    De quem é a culpa? “Dos legisladores, do governo, da polícia, da falta de juízes, da falta de vagas no sistema prisional, da falta de investimento, da má distribuição da renda, do desemprego, da falta de políticas públicas, dos baixos salários, da alta dos juros, do neoliberalismo, da crise do euro, da colonização portuguesa, da gripe suína, do derretimento das calotas polares”, bradas indignado. Tu, homo vermis, és o único triplamente qualificado como “not guilty” nessa história. Justo tu! “Por falta de provas”, provas.

    Todo teu empenho é de não punir. Inocentes ou culpa­dos, pouco importa. ‘In dubio pro reo’, desde que teus honorá­rios sejam quitados ‘in specie’ com correção, exatidão, integri­dade e… justiça.

    E assim, pelos mais variados pretextos, vais libertan­do das grades todos os poderosos tubarões, reservando os horrores dos calabouços aos despossuídos que não participam do pecúlio que sustenta a devassidão moral que apadrinhas, consagrando esse país como o paraíso da impunidade.

    Deixa de hipocrisia. A quem pretendes enganar dizen­do que és a fonte da Justiça? Teu ofício é apenas advogar em prol de vermes, devolvendo­-lhes em serviços pérfidos o vil metal que banca o suntuoso padrão de vida que ostentas. A verdadeira justiça é o oposto de ti. É tornar o mundo digno, decente, com as pessoas podendo se olhar de frente, sem dissimulações, confian­do umas nas outras. Prescindindo de teus sórdidos préstimos.

    Justiça seja feita: quem te sustenta, respeitável biltre, são apenas os safados. Crápulas que, dispensando nobres considerações éticas, estudam teus intrincados preceitos e se formam doutores para assimilar os meios legais, penais, constitucionais e amorais de permanecer impunes e qualificarem-se a ingressar em tuas ro­dinhas infames. Partilharem do papo do cafezinho do fórum. Onde, restritas às indevassáveis paredes que os protegem, ro­lam torpezas inimagináveis. Tornam-se teus amigos e cupinchas. Uma corporação fechada de rábulas parasitas. Justamente!

    Os princípios de retidão e civilidade trazemo-los dentro de nós. Num mundo de justos, tua justiça não se ajusta. Gente honrada entende-se entre si, sem necessitar da tua protocolar intermediação. Bastam os princípios. Quem carece de lei são os que dela vivem à margem. Se para os honrados, é des­necessária e para os bandidos, ineficaz, para os da escória que integras, é verba no bolso.

    Data vênia, vai pra p* que te pariu.

  • Considerações heterodoxas sobre a mulher ideal

    O mito da mulher perfeita foi criado pelos trovadores. Como a sociedade feudal era extremamente machista, e lá a figura feminina não decidia nada (a não ser, por exemplo, com que plantas aromáticas iria lavar os pés do marido), era necessário compensar essa inferioridade dando a ela contornos ideais. Nas cantigas, a mulher não é a escrava do cotidiano — é a senhora, ou a “mia senhor”. Esse tipo de culto se limitava ao plano da arte, claro; no dia a dia, a discriminação continuava a mesma.

    Do trovadorismo a imagem da mulher ideal passou ao Romantismo, que lhe acrescentou traços de santidade e morbidez. Em vez de “senhora”, ela virou santa, diva, anjo. Além de adquirir esse aspecto espiritualizado, apresentava-se pálida, clorótica, enfermiça. Freud a considerou uma representação da morte.

    Imagem da morte ou não, o fato é que os homens a perseguem. Como não a encontram, pensam que ela não existe. Engano. A mulher ideal existe, sim. Só não a encontramos porque, no momento em que a achamos, ela se torna real. Daí…

    É possível conhecer a mulher ideal mesmo que ela, acercando-se de você, não fale nada. Ou melhor: sobretudo se não falar nada, pois falando ela pode quebrar o encanto. Dirá coisas prosaicas como “nasceu uma espinha no meu rosto”, “ontem vomitei aquela buchada” ou “sou fã de Michel Teló”.

    Existe a teoria de que não achamos a mulher ideal porque, sendo o mundo muito grande, ela pode estar a milhares de quilômetros de onde vivemos. É possível que alguém more no Brasil e sua mulher ideal esteja, por exemplo, no Kuwait, namorando um sheik ou coisa parecida. A maioria dos homens tem que se contentar com a mulher viável, possível, ao alcance da mão (e de outras partes do corpo, é claro). Felizes são aqueles que nascem onde sua mulher ideal se encontra. Mas dizem que, quando isso acontece, alguma circunstância a faz mudar de lugar.

    Que características procuramos na mulher ideal? Compreensão infinita, tolerância absoluta, beleza perene. Ela deve ser irrepreensível, não repreensiva, e estar sempre pronta para o amor mesmo que tenha passado o dia à beira do fogão ou limpando o cocô das crianças.  

    Existe um teste simples para você saber se a mulher com quem se pretende casar é mesmo a ideal (embora haja algum paradoxo nisso; ninguém se casa com a mulher ideal. Ela existe para ser objeto de uma grande paixão). O teste é: não compareça a um compromisso combinado, saia com amigos em vez de sair com ela, esqueça quando ela aniversaria, diga que a sua mãe (e não ela) é a pessoa mais importante para você. Se ela quiser matá-lo depois de ouvir coisas como essas, é porque não se trata da mulher ideal. Se apenas botar uma cara feia, aproveite, pois você não vai encontrar outra que reaja de forma tão branda.

    A mulher ideal, como todos os mitos, foi criada para se constituir em referência. Lembra outro mito, o da “mulher fatal”, devoradora de corações, com quem a maioria das outras mulheres gostaria de se confundir. Não a rejeitemos, pois a função dos mitos é tornar suportável a realidade. Como, afinal de contas, se contentar com a mulher possível sem imaginar que em algum lugar do mundo se encarna aquela miragem? E que ela só não chegou até nós por um capricho da sorte?

  • #13 – PROGRAMA NOTURNO

    No silêncio sepulcral desta noite
    abro a janela
    e recebo a visita do demônio.
    Juntos travamos um pequeno diálogo
    acerca da destruição do mundo.

    Depois percorremos os cemitérios
    e os ninhos dos pássaros agourentos,
    respiramos o hálito da morte
    e compactuamos da miséria dos homens.

    A noite era fria e indiferente
    aos nossos propósitos de celebração.
    Com dedos trêmulos cavamos o altar
    de nosso macabro ritual.

    Antes, porém do sacrifício final
    fomos resgatar a memória dos corpos
    e garantir a permanência dos zumbis
    sobre a face andrajosa do planeta.

    Abrimos um caixão e uma brisa vaporosa,
    que era ao mesmo tempo fúnebre e sensual,
    despertou nossos instintos de espécie
    e pouco depois e para sempre estava
    consumado o ato lascivo e sagrado.

    Chegamos depois ao altar fatídico,
    e sob asquerosos protestos de ódio
    à vida social e fútil dos vivos,
    pegamos os punhais do sacrifício
    e nos entregamos ao suplício eterno.

    O Acaso das Manhãs

  • Carta para Maria Santa

    Maria Santa, preciso muito lhe dizer umas coisas. Coisas que andam acontecendo aqui em casa desde que você foi embora. Coisas incríveis, sabe? Os primeiros que vi estavam atrás da geladeira. Eu os encontrei numa manhã de setembro, justo naqueles dias de passagem do inverno para a primavera, quando a solidão fica mais pesada. Lembro-me de que fazia um mês que você tinha partido e eu estava me sentindo tão só, tão só, que resolvi limpar toda a casa para me ocupar. Arrastei a geladeira e os vi.

    Eram dois. Não fiquei muito surpreso quando os encontrei. Lembra-se de que falávamos que nossa casa era muito úmida? Além disso, tem chovido bastante nas últimas semanas. O barulho da água batendo na janela sempre me desperta de madrugada, e não pego mais no sono até amanhecer. Não consigo me acostumar a dormir sozinho, Maria Santa, e qualquer bobagem, como o barulho da chuva, faz com que meus olhos permaneçam abertos.

    Poucos dias depois vi mais alguns, debaixo da mesinha de canto e também sob o sofá. Estava arrumando os livros na estante, lembrando-me de como fazíamos isso juntos, e encontrei uma verdadeira colônia deles atrás do móvel, e já estavam se espalhando pelo rodapé. A casa está infestada de cogumelos. Como crescem rápido! Brotam do assoalho como se isso fosse natural. Não consigo compreender, Maria Santa. Parecem suculentos e apetitosos, e poderiam muito bem fazer parte de uma saborosa refeição. Aliás, pensei nisso: convidar você para jantar e conversar. Você ficaria surpresa com as habilidades culinárias que adquiri desde que você foi embora. Procurei na internet o melhor modo de preparar uma boa refeição com essas coisinhas, mas não encontrei nada sobre essa espécie que há aqui. E se forem venenosos?

    À noite, quando procurava meus chinelos, descobri outro grupo deles embaixo da cama. Eu sei, Maria Santa, esta casa sem você é um caos, não acho nada, onde estavam meus chinelos? Não consegui encontrar. E digo mais: na manhã seguinte, ao pegar uma camisa limpa, vi dezenas deles dentro do armário. Se você estivesse aqui, Maria Santa…

    Eles crescem em qualquer canto, sobre a escrivaninha, no teto, no banheiro, sob a pia da cozinha. Até comprei um livro que falava deles, mas, novamente, nenhuma informação sobre essa espécie. Acho que tenho aqui um tipo ainda desconhecido de cogumelo. Vou chamá-lo de “cogumelo do homem só”.

    São bonitinhos e quase não me dão trabalho. Eles não são como as plantas normais, que exigem cuidado e atenção. A essas eu me dediquei. Eu cuidei delas, sabe? Coloquei água e as deixei tomando sol para que, quando você voltasse, não as encontrasse murchas. Mas sempre me esquecia de que já havia regado, e punha água novamente. Um dia morreram afogadas pelo excesso de cuidado meu. Sob suas mãos, Maria Santa, seguramente isso não teria acontecido. Os cogumelos, não, eles não precisam de nada. Eles são assim, crescem em qualquer lugar sem ajuda, sem que lhes peçam. Apenas brotam. Gosto de acordar de manhã e ver os novos que surgiram durante a noite.

    Sempre converso com eles. Falo sobre você. Digo que, um dia desses, você cruzará a porta e os conhecerá. Também ponho músicas para tocar, aquelas que ouvíamos juntos. Às vezes leio poemas, principalmente os do Neruda, daquele livro que você me devolveu sem nunca ter lido. Eu sinto que eles gostam e estão agradecidos. E crescem. Um deles, que brotou no canto da sala, já está com quase meio metro de altura. Eu o utilizo como mesinha para o telefone e para o café. Olho para eles enquanto as horas correm. Mas as horas são lentas, Maria Santa. Desde que você me deixou, uma hora leva duas para passar.

    Mesmo gostando dos cogumelos, às vezes fico angustiado com a casa desse jeito, inteiramente tomada por eles. Tenho de fazer contorcionismo para me movimentar e andar até o quarto. Não consigo mais sair para a rua, porque eles já bloquearam o corredor e a porta. E as janelas também. Às vezes, sem querer, piso num deles e ouço seu gemido de dor, parecido com o som que sai do meu peito.

    Não há mais espaço para mim aqui.

  • O maquinista

    Na quarta-feira de cinzas, levantou às cinco da manhã e encontrou um braço de sua mãe estendido no sofá. Ubiratã Odorico Araújo Souza e Silva, ou Bira do Trem, como era chamado, tinha horário para cumprir. Era maquinista de um dos poucos trens que ainda funcionavam na região. Sua primeira viagem iniciava às seis. Não teve muito tempo para conjecturar o que fazer, então puxou o braço para o canto do sofá e o deixou por ali mesmo.

    Naquele dia não conseguiu desviar o pensamento dos acontecimentos matutinos. Em plena quarta-feira de cinzas. Não fosse ele um maquinista exemplar, sem ter uma única vez faltado ao trabalho em quarenta anos, talvez tomasse alguma atitude. Quando chegou em casa, por volta das oito horas da noite, antes de preparar o seu sanduíche, se sentou ao lado daquele braço, mirando-o por um longo tempo, sem tocá-lo. Naquela noite não leu as colunas esportivas do jornal que trazia da estação, nem ouviu o seu velho disco do Amado Batista. Dormiu sem sonhos até o despertador tocar.

    Na quinta-feira, levantou às cinco da manhã e encontrou a perna do seu pai estendida no sofá. De novo ficou a conjecturar o que faria com aquilo. Desta vez, inclusive, quase se atrasou, mas o trem partiu exatamente no horário previsto, conduzido por um maquinista esbaforido e preocupado com esses deslizes. Nunca foi disso, não seria agora, com quarenta anos de Companhia, que sujaria sua ficha. Era devoto do trabalho. Jamais ficara aborrecido ali, mesmo quando pedia a contratação de um maquinista auxiliar ao chefe, que invertia a situação com vários elogios, batia em suas costas e o levava à porta. Um camarada gentil, apesar de tudo.

    Naquela noite forrou um canto da casa com papelão velho e colocou ali o braço da mãe e a perna do pai. Gostava de ler as colunas esportivas no sofá, aqueles membros tiravam-lhe a atenção. Na sexta-feira, levantou às cinco da manhã e encontrou os olhos de sua mãe estendidos no sofá. Não perdeu tempo com eles, deixou-os com os outros pedaços no papelão velho e partiu no horário para a estação. O dia correu normalmente.

    No sábado, levantou às cinco da manhã e encontrou a caixa torácica do seu pai estendida no sofá. No domingo, foi a outra perna, depois a mão, o pé, as orelhas, e assim os dias seguiram trazendo pedaços grandes e pequenos que pareciam se completar. Na manhã em que nenhuma peça apareceu sobre o sofá, Bira comprou linhas reforçadas numa loja de artigos para pesca. A páscoa estava logo ali, ele mesmo costuraria o seu presente.

    Achou o espectro parecido consigo. Tamanho e peso semelhantes, não precisaria comprar roupas porque as suas serviriam. As roupas ocultariam inclusive as genitálias do pai, que se negou a cerzir, deixando ali um espaço vazio encoberto pelas calças, presas por um cinto bem apertado. Pensou em chamá-lo de Frank, mas desistiu e deu-lhe o nome do irmão, Álvaro. Passou o feriado contando ao irmão sua história de vida e o orgulho que sentia por ser o mais velho maquinista da Companhia. A vida, no fim das contas, tinha lhe sido generosa. O irmão era um bom ouvinte.

    Resolveu, por fim, levá-lo para conhecer os trilhos. A cadeira ao seu lado nunca fora ocupada nos quarenta anos de empresa. Álvaro, certamente, gostaria de ver as belas paisagens, os túneis e as pontes pelas quais o trem passava todos os dias. Enquanto viajavam, Bira relatava as histórias de cada trecho, contando inclusive sobre quando acabava por esmagar cachorros amarrados por ali. Não omitiu sequer as quatro vezes em que pessoas se jogaram nos trilhos, bem na sua frente, nada podendo fazer, a não ser deixá-los em pedaços. São coisas do ofício, o chefe dizia, às vezes passamos por situações complicadas no trabalho.

    Com o irmão por perto, Bira optou por requerer a aposentadoria, algo que nunca antes lhe passara pela cabeça. Gostava do trabalho. Sentia orgulho de si mesmo. Ensaiou em casa, mesmo na presença de Álvaro, o discurso que faria na Companhia. O chefe não gostou da ideia, mas acabou aceitando e pedindo apenas para que Bira gentilmente permanecesse por mais uma semana e ensinasse o ofício ao novo maquinista. Bira concordou de pronto, afinal, tinha muita experiência e gostaria de passá-la adiante, embora estivesse ansioso pelo tempo livre com o irmão. Foi no terceiro dia, ao acompanhar o novo maquinista, que o trem descarrilhou. O irmão o aguardou sentado no sofá e nem sequer estranhou a demora. Ficou por ali, dias e dias, esperando, sempre esperando.

  • Nesse Carnaval vou me fantasiar de Eunice Paiva

    O Carnaval tem raízes em festividades pagãs, como as Saturnálias romanas, nas quais os papéis sociais eram temporariamente invertidos e as pessoas se entregavam a banquetes, bebidas e celebrações sem restrições.

    Celebrado em inúmeros países até os dias de hoje, cada local tem uma maneira própria de celebração, misturando influências históricas, folclóricas e contemporâneas. O Carnaval de Oruro, na Bolívia, por exemplo, tem forte influência indígena e religiosa e a “Diablada” é a dança mais emblemática, representando a luta entre o bem e o mal. Em Cádiz, na Espanha, a festividade se destaca pela sátira das “comparsas” e “chirigotas”, que apresentam canções e paródias sobre política e cultura.

    Já no Brasil, a “folia” (palavra que significa loucura, diversão frenética) de Carnaval é essencialmente um evento que une pessoas de diferentes classes sociais, promovendo um senso de comunidade e pertencimento. Ao som do samba, do frevo e maracatu, é um espaço de manifestação artística e política, onde a alegria também pode servir para questionar e criticar livremente a sociedade.

    O tradicional uso de máscaras e fantasias simboliza essa liberdade, ajudando as pessoas a se sentirem mais à vontade portanto uma identidade diferente por alguns dias.

    Por isso mesmo, escolhi para esse ano me fantasiar (mesmo que só espiritualmente) de Eunice Paiva.

    Caracterizações de Fernanda Torres no figurino vermelho de bolinhas que ficou emblemático em Tapas e Beijos, fantasias da estatueta do Globo de Ouro, e outras criações humorísticas em torna das frases que ela pronunciou nas recentes entrevistas viraram febre de brasilidade nesse Carnaval de 2025.

    Compartilho da alegria, torcida e expectativa a respeito da premiação do Oscar nesse domingo e da força que uma manifestação de rua tão genuína pode trazer para recuperar o orgulho do cinema brasileiro, com o humor e criatividade típicos de nosso povo. Mas… escolhi me fantasiar de Eunice Paiva. Acho que a euforia do prêmio não pode ofuscar a importância da tragédia vivida pela família Paiva, reportada com tanta maestria e delicadeza por Walter Salles em Ainda Estou Aqui. Não pode deixar de homenagear a resiliência, coragem e dignidade com que essa mulher tratou o esfacelamento de tudo aquilo que lhe trazia segurança, alegria e conforto.

    Por isso mesmo, nesse Carnaval, ao ler os noticiários nada promissores em relação ao extremismo que está se configurando ao redor do mundo, vou posar de Eunice Paiva e dizer… Sorriam!

  • Romantismo anárquico

    Cerâmicas bejes, com um rejunte que nem se faz perceber, emolduram 1/4 de circunferência de uma toalha de Natal, assim disposta junto ao chão, em plena manhã nublada de sábado de Carnaval. Uma xícara moldada pretenciosamente orgânica, um falso orgânico, um orgânico em linha de produção, repousa sem o seu pires sobre o tecido dobrado, com viéis vermelho. Um café o está preenchendo, e a
    fumaça abraça um ramo de Alecrim, há o registro do envolvimento de ambos nas ondulações do líquido, escuro, quase confundindo-se com a própria xícara. O Alecrim faz as vezes de uma colher, mexendo um café sem açúcar.

    Café com aroma de alecrim, picnic solitário e instantâneo no chão da cozinha. Magia que preenche uma rotina, para que esta não exista, padrão de si. Rituais únicos. Anarquia poética.

    “Não vamos morrer por falta de coisas admiráveis, mas por falta de admirá-las”.
    Chesterton

    Memórias como pedaços do que somos, partículas palpáveis, feitas do mesmo material que as estrelas. Somos a explosão de partículas, nossas memórias, as memórias de nossos pais, avós, cidade, imenso planeta. Somos colagens belíssimas de micropartículas interestrelares, por vezes de galáxias antes impossíveis de se misturar, anos luz distantes. Somos arte. Somos instantes eternos, milagres pulsantes. Somos, além: despedidas. A todo tempo. Em todos os lugares. Somos instantes. Um breve momento em que se saboreia, com o congelar do tempo e o fechar dos olhos, o cheiro inesquecível do perfume da Dama da Noite, flor roxeada no meio de uma rua de pedestres, silenciosa no tarde das horas, que testemunham um pai ensinar ao seu filho como saborear as miúdezas de algo singelo e poderoso, beleza como promessa de se passar adiante, geração a geração. A Dama da Noite, branca, repousa e cresce as folhagens em um vaso plástico reciclado na minha varanda, sem brotar, como da primeira vez, anos antes, no aguardo, não se sabe do quê.

    Olfato. Visão. Tato.
    Paladar. Audição.

    Memória deveria pertencer ao rol dos sentidos, sexto membro. Ela não é um, tampouco outro. Por vezes os cinco, simultaneamente. Sem sombras de dúvida é um sentido, sentido da vida, do existir.

    “Estou me tornando um passageiro. E eu não sou um passageiro”.

    Filmes, pessoas e situações aparecem como resultado dos ouvidos atentos de uma tecnologia para melhorar nossas experiência de vida; ela é anterior às inteligências artificiais, e responde pelo nome de acaso. ‘Memórias de um Amor’ é uma película incrivelmente transbordante, que nos traz personagens passageiros de um veículo do qual não queriam ter embarcado.

    Memória é, na concepção que vou lhes apresentar agora, sinônimo de apego.

    Sou apegada às coisas, aos momentos, às pessoas. Herdei tal característica do meu pai, que, sem se dar conta em vida, transformou nossa morada em um verdadeiro “sebo” – definição da querida salvadora, que aparece de quando em quando para domar a bagunça e espantar o pó e os pelos do Zeca. Vassoura e
    microfibras em punho, pôs álcool, água sanitária e sacolas de lixo à obra, resgatando a dignidade arquitetônica daquele apartamento de mais de 100m², onde habitam memórias de cinco vidas, móveis para cinco casas e minha mãe. Pequeno demais para a vontade imensa de se viver que era o meu pai.

    Coisas, registros, pessoas; tenho uma queda por tudo o que é analógico, principalmente a relação que o tempo imprime às mesmas coisas, registros, pessoas. E aqui entendo a relação entre amar e a intensidade das reminiscências; não tem jeito: amo a risada dos meus amigos e, se me chegam por áudio em um smartphone, sinto-me compelida a escutá-los como se rebobinasse uma fita cassete insistentemente, a ponto de romper a fita magnética, ou arranhar um disco de vinil, fossem esses os meios. O som, as palavras, as vozes que atravessam o tempo me transportam ao passado-refúgio. Amo verdadeiramente os meus amigos. Ao voltar de Perugia, um mês que já se completou em 15 anos, colei os rostos de cada um dos que lá fiz, unidos pelo aprendizado da língua italiana, cujos endereços estão espalhados por todo o mundo, no pilar semi enterrado na parede do meu apartamento em Botafogo, acima da mesa de refeições. Assim, arrastava o prazer de tomar café todas as manhãs em suas presenças.

    Sou apaixonada por refeições sem pressa e arrumadas para o ato de se comer, saboreando tudo ao redor. Só os que me conhecem sabem de sua importância e simbolismo – e como transformei uma
    inauguração da árvore de Natal da Lagoa Rodrigo de Freitas em um aniversário mais do que emblemático, um entra e sai de amigos, dedilhar de violões, toalha xadrez, frutas e muitos quitutes, fogos de artifícios… dificilmente um picnic se tornou memória em tantas pessoas, como aquele – talvez o que teve de ser recolhido às pressas, no ano seguinte, com tenda e tudo, da Praia Vermelha, por conta de uma (baita) tempestade. Meu diminuto apartamento em Botafogo se transformou em uma releitura da confraternização ao ar livre.

    Açaís, cervejas, vinhos e limãos sicilianos. Pizzas. Karaokes/ palcos/ microfones; amo MUITO cafés. Amo mais ainda reencontros. Sou techfriendly por necessidade. Amo a vida. Amo gente (ok, ok, talvez menos do que o que sinto por cachorros – e percebo que me tornei o discurso da minha avó paterna, o que me fazia torcer o nariz).

    Amo, ainda, e talvez mais que todos os outros: cartas. Meu maior tesouro repousa em uma caixa de papelão em formato de mala – que já quase cospe papéis mais velhos que meus afilhados -, verdadeira guardiã das memórias mais preciosas. Insubstituíveis. Primeiro amor. Primeiros registros da escrita. Primeiro namoradinho. Primeiro namorado. Quase todos os outros à exceção do primeiro casamento, que evoluiu de memória ao posto de uma importante lição, apenas. Verdade seja dita, lhe sou imensamente grata pelo amadurecimento forçado e finalmente aprender que existem pessoas passageiras. Compreendi a necessidade de respeitar meus próprios limites, a limitar o acesso, consciente, de quem tira os sapatos e transpõe a porta da minha casa.

    Dentro da caixa, não estão apenas vestígios dos romances que se foram; se encontram meus melhores amigos, a “sogra” que certamente foi minha mãe em outras vidas, todos os muitos e imprescindíveis bilhetes e cartinhas dos meus pais – e do papai Noel, e do coelhinho da Páscoa. Os primeiros registros da minha irmã, nossos primeiros bilhetes. Cartões de aniversário e Natal da vovó, sempre acompanhados de um “tico-tico”. O último bilhetinho da minha avó austríaca, a melhor vizinha, que me deixou primos e tias de alma como legado. Papéis dobrados com desculpas entre primas dinda/afilhada (como brigávamos e nos ameaçávamos com “não sou mais sua dinda”, e vice-versa!). Bilhetes de “deixei o café preparado, bom dia”, da tia- mãe que me abrigou no início da faculdade. Bilhetes de amigo contendo bombom durante a aula da Pós, para amenizar minha TPM… tantas recordações… medalhas, páginas de jornais, entrevistas, prêmios… Há ainda papéis que são lembranças do que já não existe, como o embrulho de balas cujo sabor é inesquecível, passagens de ônibus com valores que beiram o surrealismo na cotação atual, de tão baratos. Cartões fidelidade de supermercados. Minha primeira viagem de avião. O recibo do primeiro aluguel da vida. A primeira compra na Italia. Camisas assinadas por todos das turmas, sempre ao final de cada série. Declarações de amizade de coleguinhas que não sei nem por onde andam. Cartas que se desenrolam em mais de um metro de papel, simbólicas entre as meninas da minha época. Elos atemporais. Bilhetes de museus. Fotografias 3×4. Polaroids, negativos, fotos 10×15, autógrafos de celebridades. Ingressos de cinema cuja tinta já impossibilita dizer de qual filme se trata – e quando. Provas de que o tempo passa deixando marcas, e que, elas mesmas se modificam. Aqui, nas cartinhas, a felicidade me espera, e me arranca lágrimas e risadas, sempre.

    Eu amo a vida que eu construi e as memórias que me construíram. Minhas lágrimas, percalços, dores, conquistas, fundos do poço, reconquistas. Meus erros, que eram primeiros passos em outras direções. Meu passado, amo-te, como amo meus livros! Biblioteca eternamente ao alcance do coração, que me empodera de mim mesma, me lembra que os meus dons são importantes – e não permite que se percam. Lanterna mágica a iluminar os momentos obscuros da estrada que percorro sozinha, de buracos e belezas necessárias.

    Um barulho irrompe pelos vidros, vibrantes e fechados das portas-janelas; sombras de serpentinas e confetes imaginários. Minha folia de 2025 não tem espaço para alegorias e adereços; fantasiei-me das minhas profundidades. Embriaguei-me dos meus sentimentos mais verdadeiros. Fiz picnic com novos amigos, abracei os de sempre, tomei vinho com cartas fresquinhas e chorei com amigos inesperados. Não preciso das fuligens, assim como carnavais não precisam de fins. Como trunfo, posso pedir reforço a querida salvadora, ocasionalmente a postos com os materiais de limpeza. Meus planos são outros, percorrem calendários e sites de viagens. Há sempre o amanhã. Há sempre recursos. E há de existir sempre uma Bia por aqui, como um você, para você, com você, por você. Eu me permito ser meu eterno e original carnaval sem quartas-feiras de cinzas.

  • Somos coisa

    De cabeça baixa andamos. Com as mãos nas teclas, dirigimos. Com um dispositivo móvel, atravessamos a rua.

    E não vemos, não sentimos, não percebemos a própria vida… tão imersos estamos no mundo digital!

    E consumimos imagens e vídeos e textos os mais variados.

    E rimos e choramos com tudo o que nos é mostrado na telinha. Com o movimento dos dedos, vamos assistindo, assistindo, pulando e assistindo até que mais um dia chegue ao final sem que vivêssemos o dia de fato!

    Sem percebermos, vamos deixando nossa humanidade a cada dia. Não interagimos! Não nos arriscamos genuinamente. Tudo é a tela!

    E estamos mais impacientes porque tudo deve ser feito em uma velocidade absurda! Não há mais paciência para os processos da vida. Todo processo é lento e requer paciência! Paciência!???

    Não argumentamos, brigamos, discutimos e acusamos sem ao menos entender do assunto. Viramos especialistas em tudo e, sobretudo, em política!

    Ah! Que saudade dos pés molhados ao andar pela praia. Que perfume gostoso das árvores e das folhas e flores no caminho à noite! E o cheiro de terra molhada então?

    Ah! Que saudade de conversas longas com os amigos e sem preocupação de tempo.

    Que saudade de fazer as coisas sem ter a obrigação, obsessão, compulsão pela tela!

    Que saudade da vida humana!

    Esta vida de agora, robótica e frenética, não é vida não! Somos mais objetos que seres! Somos coisa! E cada vez mais, insignificantes!

    Brutalizados pelas ditas polarizações, vamos colocando camadas e mais camadas de superficialidades, de verdades fragmentadas e muita afetação!

    O indivíduo pós-moderno é ele todo um objeto pulsante, eletrificado e plasmado ao mundo atual.

    Como diria o poeta mineiro, Somos a coisa coisamente!

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