Crônicas

Somos coisa

De cabeça baixa andamos. Com as mãos nas teclas, dirigimos. Com um dispositivo móvel, atravessamos a rua.

E não vemos, não sentimos, não percebemos a própria vida… tão imersos estamos no mundo digital!

E consumimos imagens e vídeos e textos os mais variados.

E rimos e choramos com tudo o que nos é mostrado na telinha. Com o movimento dos dedos, vamos assistindo, assistindo, pulando e assistindo até que mais um dia chegue ao final sem que vivêssemos o dia de fato!

Sem percebermos, vamos deixando nossa humanidade a cada dia. Não interagimos! Não nos arriscamos genuinamente. Tudo é a tela!

E estamos mais impacientes porque tudo deve ser feito em uma velocidade absurda! Não há mais paciência para os processos da vida. Todo processo é lento e requer paciência! Paciência!???

Não argumentamos, brigamos, discutimos e acusamos sem ao menos entender do assunto. Viramos especialistas em tudo e, sobretudo, em política!

Ah! Que saudade dos pés molhados ao andar pela praia. Que perfume gostoso das árvores e das folhas e flores no caminho à noite! E o cheiro de terra molhada então?

Ah! Que saudade de conversas longas com os amigos e sem preocupação de tempo.

Que saudade de fazer as coisas sem ter a obrigação, obsessão, compulsão pela tela!

Que saudade da vida humana!

Esta vida de agora, robótica e frenética, não é vida não! Somos mais objetos que seres! Somos coisa! E cada vez mais, insignificantes!

Brutalizados pelas ditas polarizações, vamos colocando camadas e mais camadas de superficialidades, de verdades fragmentadas e muita afetação!

O indivíduo pós-moderno é ele todo um objeto pulsante, eletrificado e plasmado ao mundo atual.

Como diria o poeta mineiro, Somos a coisa coisamente!

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Campista Cabral

Campista Cabral, leitor assíduo dos portugueses Camões e Pessoa, do poetinha Vinícius, herdou deles o gosto pelo soneto. A condensação dos temas do cotidiano, assim como a reflexão sobre o fazer poético, parece procurar a sua existência empírica ou, nas palavras do poeta, um rosto perfeito, na estrutura do soneto. Admirador e também leitor obsessivo de Umberto Eco, Ítalo Calvino, José Cardoso Pires, Lobo Antunes, do mestre Machado de Assis e do moçambicano Mia Couto, retira dessas leituras o gosto pela metalinguagem, o prazer em trabalhar um espaço de discussão da criação literária em sua prosa. A palavra, a todo instante, é objeto base dos contos e das crônicas. A memória, o dia-a-dia, o amor, as sensações do mundo e os sentidos e significados da vida estão presos nos mistérios e assombros da palavra.

Um comentário

  1. É, meu amigo. Mais uma vez estamos em sintonia domingueira!

    Viva a arte, que arrefece a frieza desse passar do tempo coisado! Ótimo domingo!

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