Crônicas

  • A casa do ontem

    Se existe algo que podemos considerar indestrutível é a infância. Não importa quanto o tempo ou a maturidade bombardeie esse território, quando menos se espera, dos escombros do passado, desterra-se uma recordação, um medo, um trauma, uma saudade ou um fantasma.

    As lembranças infantis têm poder de reencarnação no agora. Prova disso é o peso cortante, na vida adulta, dos apelidos pejorativos de outrora, do escárnio ou da exclusão vivida num tempo distante. Ninguém esquece o gosto amargoso de uma humilhação. Mesmo que as coisas mudem, as condições se transformem, as pessoas sejam absolutamente diferentes dos primórdios de sua evolução, a infância insiste dentro de nós. Se agarra nas vísceras, forma limo, provoca erosões. Ora traz sorrisos fortuitos, ora rasga os pontos da cicatriz.

    O curioso é perceber que ela reencarna não só nas memórias e dores, mas também nas atitudes cotidianas. Um bom exemplo disso são as redes sociais. Quem nunca se descobriu excluído do grupo secreto de amigos do whatsapp ou constatou, pelo Instagram, que foi o único a não ser convidado para uma festa de aniversário?

     A bem da verdade, a infância também se presentifica em nossas imperceptíveis tolices, seja quando fingimos não ver alguém na rua, para não ter que cumprimentar, seja comentando defeitos alheios ou fazendo pequenas fofocas.

    Para ser justa, saliento que a infância é bem maior do que suas rusgas, basta lembrarmos do quanto os afagos, colos e incentivos nos encorajaram a chegar até aqui. Então não se trata de promover uma caça à infância, até porque ela é o jardim eterno de cada um de nós. Sugiro uma boa faxina. Se a todo tempo visitamos a casa das memórias, que possamos lavar as mágoas com desinfetante, esfregar, até sair, o lodo do sentimento de menos valia, jogar no lixo as culpas e autoacusações. E, depois, vir com um pano úmido e essência de lavanda ou alfazema perfumando o ambiente.

    Feito isso, é hora de abrir as janelas, colocar uma música, contemplar o céu e orgulhar-se de si. 

    Tenho me empenhado nisso. Me recuso a criar um altar de lembranças dolorosas e culto a pessoas infelizes, invejosas e cruéis.

    A missão é habitar-me com harmonia, cercar de afeto o perímetro da existência e apostar nas minhas escolhas.

    Ainda que o amor do outro me anime, não me valida ou constitui.  

    Amigos, venham visitar a minha casa. Limpa, florida e perfumada!


  • A ambiguidade é inimiga da clareza

    Ambiguidade é a duplicidade de sentido. Ela pode se constituir num bom recurso expressivo, mas deve ser evitada quando compromete a clareza do texto. São ambíguos enunciados do tipo:

    — “Vivemos numa sociedade cuja aparência é mais importante do que a essência.” (o uso de “cujo” no lugar de “em que” dá a entender que a aparência da sociedade é mais importante do que sua essência, e não que na sociedade atual a aparência importa mais do que a essência);  

    — “A maioria das redes e blogs dá apenas uma visão parcial do indivíduo que publica.” (não está claro se quem publica é o indivíduo ou a maioria das redes);

    — “Um grupo de assaltantes rendeu elevou o carro de uma família.” (parece que o grupo rendeu o carro antes de levá-lo!!).

    Um dos fatores que levam à ambiguidade é a má ordenação das palavras. Quando o período não está na ordem direta, pode haver margem para mais de uma interpretação. Por exemplo: “Encontrou o diretor o secretário na sala de reuniões”. Não se sabe quem encontrou quem.  Na ordem direta, em que o sujeito aparece antes do complemento, desfaz-se o equívoco: “O diretor encontrou o secretário na reunião.” Outra forma de distinguir sujeito e objeto é antepor uma preposição a este último: “Encontrou o diretor ao secretário na sala de reuniões”. 

    Deslocar o atributo oracional para longe do termo que ele modifica pode tornar ambígua a frase: “Refiro-me a um conflito no meu namoro, que ocorreu há oito anos”. O que aconteceu há oito anos – o conflito ou o namoro? Como a referência temporal diz respeito ao conflito, o melhor para a clareza é deslocar a oração adjetiva: “Refiro-me a um conflito que ocorreu há oito anos no meu namoro”.

    A separação entre componentes de uma mesma função sintática também pode gerar ambiguidade. Exemplo: “As pessoas que gostam de saber das novidades procuram a internete até mesmo as grandes empresas, para vender seus produtos.” O aluno dá a entender que apenas “pessoas” é sujeito do verbo procurar, e que “internet” e “grandes empresas” são objetos diretos. A frase fica sem sentido, pois o propósito do autor era afirmar que tanto as pessoas quanto as empresas procuram a rede. Ele traduziria claramente essa ideia se tivesse mantido coordenados os sujeitos: “As pessoas que gostam de saber das novidades e até mesmo as grandes empresas procuram a internet para vender seus produtos.”

    No plano semântico, é comum haver ambiguidade devido à polissemia. A diversidade de sentidos de uma mesma palavra pode levar a que se diga o que não se queria dizer. Em redação sobre a atual crise da Igreja, outro aluno escreveu: “Hoje, por força das circunstâncias, a Igreja admite a pedofilia em alguns de seus membros”.

    Entre os significados de “admitir”, está o de “reconhecer” (“Ele admite seu erro”); o redator quis dizer que a Igreja, forçada pelas circunstâncias, reconhece que há pedófilos entre seus membros. Não lhe ocorreu que esse verbo tem também o sentido de “aceitar”, “permitir”, o que poderia levar a um julgamento negativo da instituição religiosa.

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  • O mais importante é a mudança!

    Em cada época de nossa existência, sempre tentaram explicar o funcionamento do cérebro através de metáforas extraídas da tecnologia mais atualizada do momento. A descrição que ficou famosa foi realizada por Platão, que comparou a psique humana a uma biga puxada por dois cavalos, onde um representava a razão e o outro o desejo.

    No século XX os psicólogos compararam nosso cérebro a um computador, que eventualmente apresentava um “bug” em seu sistema operacional.

    Exemplos assim são tentativas de expor nossa influência social exercida em muitos gestos que são o resultado do que somos, de nossa base existencial.

     Diversas atitudes nascidas do meio ambiente nos ensinam comportamentos similares, para sermos aceitos e conduzirmos a mesma máxima interessada pela maioria, sem sombra de dúvidas.

    E como animais sociais, pertencemos à casta de nosso grupo mais próximo, fazendo o papel necessário para pertencermos ao meio que chegamos, por isso não há muitas opções além daquelas já expostas e pegas na prateleira social.

    Possuímos a estranha mania de copiar e colar em nossas cabeças, atitudes bem aceitas e lavadas pelo sistema, que está pronto para entregar a dose certa na boca, e o lado correto de dar o ombro. Nosso conteúdo influenciado pelo meio se mantém absorto e na expectativa do próximo ato, que virá para conduzir o que podemos pensar e o que devemos atuar depois de um texto bem decorado.

    A fadiga por momentos não é uma opção e sim pausa para repor o próximo cartucho. Por isso vos digo, que a vida é curta demais para ser pequena.

    “Mude, mude de novo, experimente outra vez, atue, você certamente encontrará coisas melhores, e coisas piores que as já conhecidas, mas não é isso que importa, o mais importante é a mudança, porque se você tem mais medo da mudança do que da desgraça, você não impede a desgraça, a mudança, o movimento, o dinamismo, a energia, só o que está morto não muda. Repito por pura alegria de viver, a salvação é pelo risco, sem o qual a vida não vale a pena” (Antônio Abujamra).


  • Arte da imperfeição

    Perfeito vem do Latim “perfectus”, que na cultura grego-latina significa acabar, terminar, completar sem faltar nada. Nós, os que, como eu, fomos criados com esse modo de ver ocidental e dicotômico de ver o mundo, tendemos a buscar essa perfeição em tudo o que nos cerca.

    Cultuamos o prazer imediato, a busca do melhor, a valorização do maior – temos necessidade do completo. Maiores prazeres, melhores oportunidades, o desejo como valor que impulsiona o progresso. Nesse modus vivendi não há espaço para imperfeição, para o menos, o quase, o em parte.

    Esticamos a régua na medida da perfeição, do superlativo, muitas vezes inatingível. Se tropeçamos na jornada, muitas vezes preferimos mudar totalmente de caminho a diminuir as expectativas e se sentir bem com o incompleto.

    Nas relações, não nos acostumamos a aceitar os defeitos alheios nem as nossas fragilidades.  A conviver com o que é dissonante, com o que não atinge o padrão que esperamos.

    Se ampliarmos essa observação para o modo como lidamos com as coisas em geral, perceberemos uma tendência a descartar tudo o que, de alguma maneira, não atingiu a perfeição, envelheceu, perdeu o viço, se rompeu ou quebrou.

    Para não ter que conviver com a frustração do não perfeito, o caminho que adotamos com frequência é abandonar os cacos, que é mais fácil do que tentar aproveitá-los para fazer nascer algo novo.

    Quem consegue ver nesses fragmentos do que foi desfeito a possibilidade de reconstrução em um novo formato de relações, um novo arranjo de forças ou uma nova estética, é quem saiu em busca de um elemento de amálgama que unisse os cacos e fosse capaz de reinventar a beleza, na imperfeição.

    Abraçar a arte da imperfeição é abandonar os limites impostos pela ditadura do perfeito, para adotar um ensinamento oriental que vem conquistando mais e mais adeptos, e pode ser exemplificado pelo Kintsugi. Seguindo uma tradição milenar japonesa, o Kintsugi consiste em realçar as fissuras dos objetos que se quebraram, envelheceram ou estragaram por meio da aplicação de ouro para juntar as peças.

    O resultado é uma verdadeira obra de arte, a arte da reconstrução de algo que tem valor para quem consegue enxergar beleza na imperfeição – das coisas, das pessoas, das relações e da própria vida. Para quem cultivou esse amálgama de ouro dentro de si.


  • A nossa vida dos outros

    Queremos mais que uma vida. Queremos viver várias vidas. Desejamos ser piratas, mouros, cantores famosos, astros do cinema, reis e cavaleiros. Desejamos ser o outro e nunca nós mesmos. Não reparamos no espelho o nosso rosto… Em que espelho ficou perdida a minha face? Deixamos o tempo passar. Deixamos nossas coisas para deslumbrar outra vida, outras vidas. Nos assustamos depois com o que vemos: velhice.

    O pior de tudo é quando nos metemos na vida do outro. Somos os donos do conhecimento. Entendemos todos os males e problemas alheios e não sabemos resolver os nossos.

    No entanto, possuímos apenas uma única e delicada vida. Se há ou não há aventuras ou tesouros, grandes batalhas ou fantásticos enigmas, não importa. Importa a vida. A nossa.

    É cotidiana e tributável e a mesma e a mesma e a mesma continuamente? O que fazer? Somos humanos. Somos falhos. Somos loucos e controversos. Somos o próprio conflito e o próprio caos. E quando amamos, tudo piora. Tudo alcança dimensões maiores e mais dramáticas. E morremos sem morrer. E perdemos e ganhamos e continuamos a jogar seja qual for o jogo. E é assim e sempre será. Estamos vivos e este fato, por si só, possui um valor incalculável.

    Queremos outras vidas, mas temos uma, uma só para gastar e para amar e para chorar. Não percamos tempo.

    O que se há para viver, viva. O que se há para gastar: gaste. O que se há para amar: ame. O que se há para chorar: chore. Tudo no seu tempo…

    Encontre-se e perca-se e deixe-se levar. Aprume-se, endireite-se e siga o que há de significante. Veja ou não veja. Sinta ou não sinta. Escreva ou leia ou faça os dois ou nenhum dos dois. Faça o que é importante para a sua vida.

    Queremos mais que uma vida. Queremos viver várias vidas. Queremos viver a vida dos outros.

    No entanto, a melhor e mais valiosa a ser vivida, definitivamente, será a nossa…


  • Só se vive no agora

    Num almoço animado com as amigas, um engasgo rasga o tempo entre o vivido e o viver. O ar não passa pela garganta, os olhos arregalam diante da impossibilidade da salvação. Um ruído no peito anuncia o desengonçar dos segundos, a fragilidade do devir. Tento tossir, não consigo. O que parecia abundante se torna rarefeito. O ar não entra, não sai. Meu olhar aterrorizado de desespero encontra o olhar pronto da amiga médica. Uma manobra feita.  Nada. De novo, nada. Mais uma vez. Tento. Tento. Ouço meu nome entre pedidos de calma. Alguém me abraça pelas costas. Me aperta. Me sacode. Penso no sorriso do meu filho. Nas pessoas que eu amo. Que seja assim a despedida. Que me amparem as melhores memórias.

    O ar volta, a vida abraça, a morte se vai. 

    Uma alegria faceira dança em meus lábios. As cores retornam aos seus lugares, os sonhos se arrumam, mais uma vez, nas gavetas do pensamento.

    Uma certeza ordinária me agarra: sobrevivi!

    A obviedade corpórea desses feitos (respiro, enxergo, ouço, falo, ando) esconde no cotidiano um segredo cruel: a qualquer momento o sempre pode decidir partir.

    Hoje, por sorte, bênção ou privilégio, ele decidiu continuar a meu lado. Então, que me acompanhe no ensaio da minha escola de samba.

    O sempre só existe no agora!


  • Uma Vida

    Dramas gigantescos da humanidade oportunizam momentos para que indivíduos de bom coração se tornem heróis, e figuras lembradas por não terem se acomodado perante um drama, como é comum a muitos. 

    Uma deles foi Sir Nicholas George Winton, que nasceu em Londres em 1920, onde mais tarde foi corretor da bolsa de valores de Londres e um socialista fervoroso do Partido Trabalhista. Tornou-se parte de um círculo de esquerda preocupado com os perigos representados pelos nazistas.

    Quando visitou Praga em 1938, se deparou com famílias vivendo em condições extremamente precárias e sob a constante ameaça de uma invasão nazista. Em uma corrida contra o tempo, Winton e um improvável grupo de apoio, trabalharam incansavelmente para resgatar o maior número de crianças possível, antes do fechamento das fronteiras.

    Ele ajudou a salvar 669 crianças judias da morte certa, nos momentos que antecederam o início da Segunda Guerra Mundial.

    Pouco antes do Natal de 1938, quando Winton tinha cerca de 29 anos, ele planejava passar suas férias esquiando na Suíça, entretanto, após o pedido de um amigo, mudou o trajeto até Praga para ajudar o Comitê Britânico para Refugiados da Tchecoslováquia — país que estava em processo de ocupação pela Alemanha nazista. Winton passou um mês no país, retornando a Inglaterra seis semanas antes da ocupação alemã. Após a Noite dos Cristais Quebrados, a Câmara dos Comuns aprovou uma medida que permitia a entrada de refugiados na Grã-Bretanha com menos de 17 anos, desde que tivessem um lugar para ficar e uma garantia de £50 por pessoa, que fosse depositada, para garantir seu eventual retorno ao país de origem. Com todos os trâmites, Winton ajudou a resgatar as crianças que fugiram de trem numa operação chamada de Kindertransport

    Em seu país natal, ele e sua mãe, Bárbara Winton, recebiam os refugiados e encontravam novos lares para essas crianças.

     Aquelas vidas foram salvas por meio de oito trens que partiram de Praga com destino à Londres. O filme “Uma Vida” narra de forma tocante o trabalho humanitário de Nicholas Winton. Uma cinebiografia, baseada no livro homônimo escrito pela filha de Nicholas, Bárbara Winton, onde o ator Anthony Hopkins, aos 86 anos, entrega uma interpretação comovente e retrata com fidelidade aquela história importantíssima da Segunda Guerra Mundial. Um enredo que se desenrola de maneira intensa e merece ser assistido.


  • Sobre as angústias de um pé-frio

    Tenho muito medo da morte. Um medo estranho, próximo, escuro, paralisante por vezes, e por vezes aterrador. Isso não me obriga a amar demais a vida. Não acho tudo maravilhoso, não faço parte da galera do gratiluz nem gosto de acordar cedo. Geralmente, estimo a vida nas sextas após o expediente e nos sábados à tarde. Mesmo assim, ante o bafo azedo do óbito, até a semana corrida me apetece. Um dos motivos de preocupação e temor quando penso nesse assunto, em particular, é a provável impossibilidade de seguir acompanhando as ocorrências terrenas. Sendo sincero, meu receio, por idiota que pareça, é não saber do Grêmio no pós-morte.

    Sei que há coisas mais importantes, você não precisa me explicar o quanto isso é mesquinho, mas é a mais crua verdade. O fato é que me apavora a ideia de estarmos (ou estarem, no caso) em 2158 sem saber quantos Estaduais, Brasileiros e Libertadores o Grêmio ganhou nesse período. Me apavora não saber quem surpreendeu e quem decepcionou. Me apavora desconhecer a quantidade de Grenais vencidos com facilidade até lá. Espero que todos, naturalmente.

    Tudo isso é uma grande bobagem. Eu sei. No fundo, odeio gostar de futebol. No entanto, sou daqueles que fazem compras nos patrocinadores do time, que evitam usar qualquer item na cor vermelha, que pagam quinhentos reais numa camisa, que tomam calmantes antes das partidas importantes e que choram escondidos quando dalgum revés. Só não perco o apetite porque não misturo as coisas, afinal, futebol e comida são categorias diferentes. Além disso, ainda há o maior problema, o que me causa mais
    desgosto: sou um baita pé-frio.

    Aqui estacionamos num paradoxo complicado. Quero acompanhar o Grêmio mesmo após a morte, mas nunca presenciei sequer uma vitória no estádio, mesmo com inúmeras tentativas. No máximo, assisti uns empates suados jogando feio. Nos últimos anos, o complexo pé-frio se estendeu aos jogos que assisto pela televisão. Meio a contragosto, fico longe dela simulando ocupações, para só depois descobrir o resultado. Mais tarde vejo os melhores momentos, as entrevistas, as análises de cada lance e acompanho as especulações na imprensa especializada, longe da taquicardia, do desespero e do abraço irreparável do azar. Parece que estou sempre ouvindo atrás da porta.

    O Grêmio e eu vivemos numa espécie de gangorra. Sempre que o time ganha eu estou em outro lugar, atribulado com algum compromisso. Jamais permanecemos na mesma linha por muito tempo. Talvez seja coisa do acaso.

    A principal conquista dos últimos anos foi a Libertadores, em 2017. É claro que assisti aos jogos, o estranho foi que durante uma das partidas mais difíceis, contra o Botafogo, nas quartas de final, caiu a luz no meu bairro e só depois do apito final, já no meio da madrugada, retornou. O Grêmio venceu, mas eu não vi.

    Na semifinal, contra o Barcelona de Guayaquil, tive uma crise hipertensiva após aquela defesa histórica do Marcelo Grohe no início do segundo tempo. Jogo tenso, ansiedade incontrolável. Fui parar no hospital. Outra vitória sem mim. E tem mais.

    No primeiro duelo da final eu voltava de viagem. O trabalho também apita nesses acasos. No ônibus, aflito e inquieto, mal conseguia conectar a transmissão. Soube do resultado numas falas entrecortadas do Pedro Ernesto Denardin, da Rádio Gaúcha, em algum lugar entre União da Vitória e Palmas. A partida já havia acabado.

    Durante o segundo jogo eu participava de um Congresso de Literatura, em Pato Branco, sobre a obra de Nelson Rodrigues. O palestrante era o professor Luís Augusto Fischer. Eu realmente precisava daqueles créditos. Na saída ouvi um foguetório e parei no primeiro bar em que encontrei alguns torcedores do Grêmio. Lá assisti aos replays dos gols enquanto bebia canecas e mais canecas de chope. A palestra foi muito interessante, mas o professor Luís Augusto Fischer é colorado fanático. O Grêmio ganhando a sua terceira Libertadores e eu assistindo um colorado palestrar. Às vezes a
    vida é cruel.

    Esse paradoxo tem me angustiado. Meu pé-frio é evidente e comprovado, os amigos sabem disso. Me excluem dos churrascos durante os jogos para garantir mais chances de vitória do tricolor. Ultimamente, por conta dos sites de apostas, eles só falam em probabilidades. Isso nos distanciou ainda mais. Não sei se a morte resolverá o problema e também não estou disposto a descobrir. No entanto, se no pós-morte o meu pé-frio acabasse, talvez a temesse um pouco menos. Orgulhoso, então diria:

    —  Não dá, hoje tem jogo do Grêmio.


  • A Troca

    Na quietude da noite, em meio ao escuro do quarto, eles iniciam uma conversa.
    Uns indignados, outros seguros de si, e alguns, incrédulos.
    Como todos a conhecem, não poderia ser diferente.
    —  Naturalmente, diz o preto, eu me
    garanto; vou com ela aos mais diversos lugares, do escritório às noitadas, restaurantes e bailes. Comigo ela fica tranquila, sabe que não sou inconveniente.  Dou segurança e conforto. Portanto, serei o último a ser trocado ou nem isso, podem apostar!
    — Querido, presta atenção!
    Sabemos o quanto você a atende  e, por isso, acaba sendo o preferido. Mas não  pense que é pela sua cor.
    Eu por exemplo!
    Também vou a todos os lugares, sou seguro, discreto e tudo mais.
    — Alguém me nota?  Só se for para perguntar onde ela me encontrou. E suas amigas ainda dizem: com esse não tem erro! A cor não é o ponto da questão, já que sou considerado pardo.
    — Verdade! eles dizem, ao mesmo tempo.
    — Eu não sei de nada, pois sou a companhia certa dela para irmos em casamentos, batizados e ocasiões especiais. Estranho seria se não fosse assim. Só os brancos me entenderão!
    Eles estavam ali, no quarto dela, discutindo, buscando entender o que havia.

    Tudo aconteceu muito rápido.
    Há pouco tempo, ela ficava dois ou tres dias em casa, resfriada talvez; aos finais de semana ia à praia, ou então apenas descansava em sua rede com os pés descalços, lendo um livro. E eles permaneciam tranquilos a aguardando.
    Depois, ela passou a quase não sair mais de casa. Separou peças do guarda roupa, colocou em sacolas, etiquetou, limpou gavetas, caixas de quinquilharias e foi arejando o seu quarto.
    Na manhã que a amiga foi buscar as sacolas de doações, eles entenderam tudo.
    Seriam descartados!
    E essa foi a razão da surpresa e da conversa noturna.
    — Ela não nos traiu, disse o preto.
    Mesmo quando trouxe para casa os baixinhos disfarçados, marrentos e cheios de si, ela nos revezou entre eles.
    — Embora cada vez menos nos procurasse, um deles resmunga com um muxoxo.

    Nada mais havia a ser dito.
    A discussão terminou, a Reflexão se impôs e disse:
    — Imaginem como não deve ser fácil para ela nos deixar ir embora.
    Somos amados, bons, fortes e de qualidade. Ainda podemos ser úteis e
    parceiros de outras mulheres.
    E ela?
    O Amor responde:
    — Fizemos parte da sua vida e amar significa deixar espaço para o novo.
    Nada é descartado ou trocado. Nem coisas e nem pessoas.
    Ela está bem.
    E vocês também ficarão. 
    Portanto, entrem em suas caixas, vamos!
    — De fato, disse o mais antigo…
    E aos pares, foram se acomodando.
    É o ciclo da vida, resumiu o amarelo.


  • A sucinta e individual força dos Verbos e Substantivos:


    (…)

    “vence, leva, ‘sai-vitorioso’, fede, terminam, caminham, garantir, levou, votarem, vence,
    consolida, vence, conquista, foi-eleito, abandonaram, levar, conversam, ‘não-fará’,

    pede, nega, inclui, deixar”

    (…)

    Arizona, estados-chave, eleição; disputa, estado; estados-chave, eleição; vitória,
    eleições; contagem, delegados, ‘X’; maioria, câmara; mulheres, EUA, republicano;
    Arizona, vitória, estados-pêndulos; 7-Estados; presidente, pobres, ‘faxina’, pentágono, sombra, COP29, Azerbaijão, eleição, parte, governo, alívio, acusações, complô,
    posição,
    Ucrânia, sinais, Kremlin, EUA

    (…)

    passado futuro Biden Lula Trump Bolsonaro posse vitória Trump pai chances Moraes vitória Trump sinal alerta Lula dois-mil-e-vinte-e-seis senador foto vitória Bolsonaro utilidade Lula candidatos Bolsonaro vitória Trump dois-mil-e-vinte-e-seis apoio
    Bolsonaro Trump Lula ex-presidente Trump

    (continua).


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